Numa altura em que tanto se fala das novas formas de família – famílias monoparentais, famílias reconstruídas, famílias constituídas por casais homossexuais, etc. – resolvi escrever sobre uma característica que tanto está presente nas famílias do modelo tradicional como nas famílias “modernas”.
Os membros das “famílias tabuleiro” raramente se reúnem, não têm tempo ou disponibilidade para grandes conversas, nem tão pouco para estarem juntos durante as refeições. O tabuleiro no quarto permite que cada pessoa possa tomar as suas refeições de forma sossegada, de acordo com o horário mais conveniente, e, de preferência, em frente da televisão e/ou do computador.
Mas existirão apenas vantagens a envolver este hábito? Que importância atribuímos às conversas acaloradas à volta da mesa? Até que ponto é que o bem-estar que o sossego do quarto proporciona compensa a ausência de gargalhadas em família? E as zangas? Não serão também uma componente importante da vida familiar?
O stress por que passamos ao longo do dia – em contexto escolar, no caso dos mais novos, e em contexto profissional, no caso dos adultos – parece conduzir-nos a um estado semi-vegetativo que, do meu ponto de vista, tem muito pouco a ver com qualidade de vida e bem-estar.
A maior parte de nós já passou pela experiência de, no final de um dia extremamente cansativo, não ter estofo para ouvir mais ninguém. Nessa altura, a única coisa de que precisamos é de um banho quente, uma refeição para aconchegar o estômago e… paz. Se pudéssemos, iríamos para um hotel (ou enviaríamos o resto da família para lá, ficando com a casa livre) – faríamos qualquer coisa para não ter que ouvir mais queixas ou perguntas.
Admito que também já cheguei a casa com uma frase a martelar-me a cabeça: DEIXEM-ME EM PAZ!!!
O que não consigo perceber é como é que uma família pode ser feliz se viver sistematicamente desta maneira. Se numa casa houver mais televisores do que pessoas e se o tempo dedicado às tecnologias substituir totalmente o convívio entre os membros da família, dificilmente há espaço para a intimidade.
Não tenho nada contra a televisão, nem considero que o facto de os adolescentes disporem de um computador no quarto seja uma fonte de problemas. Mas como em quase tudo na vida, estas formas de entretenimento devem ser doseadas, sob pena de pais e filhos não se conhecerem verdadeiramente.
Todas as famílias têm problemas (onde é que eu já li isto?) e o isolamento é apenas um mecanismo de fuga pouco eficaz para quem pretende que eles sejam resolvidos.
P.S. Ao escrever este texto, sorrio. Recordo a adolescência e a irritação que sentia perante a “inflexibilidade” do meu pai. Para ele, as refeições só podiam ter lugar quando todos estivessem à mesa.