O nascimento de uma criança é quase sempre fruto de um amor, pelo que se espera que, nessa altura, os membros do casal estejam mais unidos do que nunca. Palavras como infidelidade, separação ou divórcio parecem ter pouco que ver com esta fase do ciclo de vida. De facto, isso é verdade para a generalidade das famílias. Contudo, as excepções a esta regra são bastante mais frequentes do que se pensa.
A vinda do primeiro filho está quase sempre envolvida num clima de idealização e, se essa idealização for excessiva, isto é, se o casal não estiver preparado para enfrentar os obstáculos, os conflitos tendem a subir em flecha. Por exemplo, a generalidade dos jovens casais sabe que ter um filho implica noites mal dormidas, mas quantos estarão verdadeiramente conscientes do impacto das alterações de sono? Quantos se preocupam em dividir equitativamente essa “carga de trabalhos”?
A prática clínica permite-me concluir que os casais que dividem de forma equilibrada as responsabilidades domésticas estão mais aptos para lidar com as contrariedades inerentes aos cuidados prestados ao bebé. É que estes casais estão habituados a dialogar, a respeitar-se mutuamente e a encarar a vida a dois como um projecto.
Pelo contrário, nos casos em que as tarefas domésticas estão maioritária ou inteiramente a cargo da mulher, os membros do casal tendem a sentir-se mais tensos aquando do nascimento do primeiro filho. Nesta altura há uma espécie de explosão – a mulher não consegue dar conta do recado, nem entende como é que o marido pode estar tão distante, enquanto este não sabe o que fazer (porque também não está preparado).
Noutros casos a mulher assume por inteiro os cuidados prestados ao bebé, impedindo o pai de realizar qualquer tarefa, o que contribui activamente para o afastamento do casal. Esta atitude perfeccionista não é só prejudicial para o casal – apesar de a nossa cultura alimentar a ideia de que o bebé depende exclusivamente da mãe, a participação do pai é indispensável.
Outra dificuldade por que os casais passam nesta fase está relacionada com as alterações no corpo da mulher. Infelizmente, alguns casais não conseguem falar abertamente sobre isso, resignando-se ao progressivo afastamento sexual e emocional. Assim, geram-se ciclos viciosos com relativa facilidade: o marido acusa a mulher por estar gorda e flácida, enquanto esta o acusa de ser insensível e de pensar exclusivamente em sexo.
O desgaste provocado por todas estas alterações pode conduzir a sentimentos de frustração, desvalorização pessoal e sensação de vazio. As carências afectivas daí resultantes explicam por que algumas pessoas são infiéis neste período. Nestes casos, a relação extraconjugal não é fruto de uma paixão avassaladora, mas da necessidade de valorização e de proximidade emocional e sexual.
Como nunca é tarde para tentar ultrapassar os problemas, vale sempre a pena investir na expressão clara dos sentimentos e das necessidades de cada um. Desse diálogo podem resultar compromissos importantes, reconhecimento das falhas cometidas e, se necessário, a assunção de que é importante recorrer ao apoio especializado.