Sim, é verdade que há casais muito responsáveis, que colocam os interesses dos filhos – sobretudo a sua estabilidade emocional – à frente de tudo. Não são super-homens nem super-mulheres; sofrem – porque a separação é sempre sinónimo de algum sofrimento -, perdem parte daquilo que construíram, sentem dúvidas em relação ao futuro, enfrentam a angústia da guarda partilhada. E às vezes também se deixam abater, deprimem-se e precisam de ajuda. Por outras palavras, os casais que procuram defender os seus filhos e protegê-los das agruras do divórcio não são mais fortes do que os outros. São só emocionalmente mais inteligentes.
Os outros, aqueles que erram mais nestas alturas e que enveredam por processos altamente destrutivos – quer para os adultos, quer para as crianças – nem sempre se apercebem da amplitude dos seus gestos.
A Clara tem 11 anos, é a mais velha de três irmãos. Os pais estão em processo de divórcio, que inclui a luta pela guarda dos filhos. É apenas uma menina, mas conversa abertamente sobre as guerras dos adultos. Ainda que só lhe tenha colocado duas ou três perguntas genéricas sobre a sua família, desfia rapidamente o novelo de preocupações e angústias por que tem passado. «O pai zangou-se com os avós maternos porque estes lhe “roubaram” não-sei-quantos mil euros; a mãe não tem para onde ir porque a casa é do pai; os ‘manos’ dormem no quarto da mãe, para que o pai não esteja com eles, porque a mãe não quer; o tio morreu porque os avós maternos não cuidaram dele – foi o pai que disse; a mãe ‘roubou’ algumas peças lá de casa para se salvaguardar; o pai tem outras mulheres, talvez até outra família; a mãe só quer o bem-estar dos filhos, por isso, passa os fins-de-semana com eles na rua – para que o pai não lhes ponha a vista em cima; a polícia já foi lá a casa algumas vezes – às vezes é o pai que chama, outras é a mãe; agora vem aí a audiência com o juiz e vai ficar tudo resolvido, desde que o pai pague o que a mãe pediu, que é o que é justo».
Este não foi um casamento marcado pela serenidade e pela estabilidade. Mas pouca coisa, ao longo dos últimos 13 anos, faria supor que a pequena Clara e os irmãos seriam sujeitos a tantas formas de violência. Aos olhos dos familiares e amigos, os pais destas três crianças constituíam um casal “normal” – sempre foram bons trabalhadores, colocaram os filhos em boas escolas e, aparentemente, não teriam mais problemas do que outros casais da mesma faixa etária. Mas a guerra em que se transformou o seu divórcio trocou-lhes as voltas.
São muitos os casos em que os membros do casal precisam de ajuda para lidar com a separação. Mas se já não é fácil que um casal se entenda quanto à hipótese de recorrer à terapia para tentar a reconciliação, imagine-se o quão difícil pode ser levá-los a sentar-se na mesma sala para resolver questões relacionadas com a sua separação. Nalguns casos, é o próprio tribunal que os encaminha para um processo de mediação familiar, em nome do bem-estar dos filhos, sobretudo. Noutros, é pelo menos um dos ex-cônjuges que reconhece que é preciso recorrer a alguém que esteja emocionalmente distanciado da situação e que possa abordar os problemas com imparcialidade.
A mediação familiar pode ocorrer em qualquer fase do processo de separação – antes ou depois de o casal dar entrada dos “papéis” – e pretende promover a resolução de conflitos de forma a preservar a qualidade das relações familiares. Depende sobretudo da voluntariedade dos adultos envolvidos: se ambos se dispuserem a estar presentes nas sessões e a cooperar, reduz-se drasticamente o litígio.