É cada vez mais frequente assistir-se a debates mais ou menos fervorosos acerca da (in)disciplina das nossas crianças. Se, por um lado, é verdade que têm existido mudanças muito positivas no desempenho do papel parental – as gerações mais novas são, de um modo geral, melhores pais do que as gerações mais antigas – também há que reconhecer que nalgumas famílias impera aquilo a que frequentemente se chama infantocracia. E o que é a infantocracia? É o modelo familiar que se caracteriza pelo facto de os pais girarem à volta dos filhos. Não estamos a falar de pais mais altruístas, ou de um amor maior. Estamos, isso sim, a falar de uma das maiores formas de violência que é possível incluir na educação de uma criança.
Em muitos casos a origem deste padrão comportamental está precisamente no facto de estes adultos terem sofrido – muitas vezes na pele – as agruras de uma educação marcada pela austeridade e pelo autoritarismo. Mas até que ponto será justo descarregarmos as nossas mágoas na educação dos filhos? Afinal, a permissividade, a incapacidade para dizer não ou os sentimentos de culpa associados à definição de limites são tão ou mais nocivos do que o autoritarismo.
A verdade é que uma criança que cresça sem limites não tolera a espera, é incapaz de adiar a satisfação, o que tem implicações severas para a sua socialização. É que os outros adultos e as crianças com quem conviverá a partir do momento em que for para a escola não estarão à altura das suas expectativas ou dos padrões a que está habituada. Em casa, a mãe é capaz de adiar uma ida à casa de banho para lhe contar pela 40.ª vez a história preferida… Fora de portas é difícil gerir a frustração.
Dominados por sentimentos de pena e de culpa – muitas vezes pelo facto de estarem todo o dia fora a trabalhar – alguns pais sentem dificuldade em dizer não às vontades dos filhos. Assim, os desejos das crianças transformam-se facilmente em leis a que os adultos da casa se submetem praticamente sem contestar. Claro que há dias mais difíceis, em que o pai ou a mãe explode. O facto de ter acumulado outras preocupações está quase sempre na origem de uma espécie de sequestro emocional que toma a forma de uma palmada.
E o que é a palmada, senão uma explosão de raiva do adulto? Não, eu não defendo a ideia de que uma simples palmada – muitas vezes indolor – seja especialmente traumática. Mas também não acredito nos seus efeitos pedagógicos. Uma criança pequena dificilmente associará o castigo físico ao seu comportamento. No máximo, sentirá a dor provocada pelo açoite e aprenderá que, quando suficientemente irritados, os adultos podem adoptar este comportamento.
A criança desarrumou os brinquedos? Deve ser ela a arrumá-los. Não arruma? Então, não joga Playstation, não vê televisão nem acede ao computador. Estes castigos são tão mais eficazes quanto mais coerentes forem os adultos. Se os pais forem rigorosos, o que implica manter-se firmes em relação aos castigos, por exemplo, conseguirão educar os filhos com autoridade e disciplina. Mas o exemplo dos pais também conta – de que adianta tentar educar os filhos no sentido de cooperarem com estas tarefas se os pais deixarem as suas próprias coisas espalhadas pela casa?
Mesmo as crianças pequenas são perfeitamente capazes de perceber e interiorizar regras e de estabelecer a associação entre mau comportamento e castigo. Contudo, é importante que os pais (e os outros educadores) expliquem aos seus filhos o que esperam deles ANTES de qualquer castigo. Assim, quando o seu filho se estrear a decorar as paredes da sala com os lápis de cor, importa que possa dizer-lhe que estes só podem ser utilizados no papel. Esclareça que, se o comportamento se repetir, haverá um castigo (defina claramente a medida a aplicar no futuro). Escusado será dizer que, em caso de reincidência, a coerência é fundamental. Fechar os olhos aos erros das crianças é um comportamento regular, mas as consequências são invariavelmente nefastas.
Como ninguém reconhece autoridade a pessoas injustas, é importante não subestimar a importância dos elogios. Sempre que uma criança se esforça por melhorar o seu comportamento deve ser elogiada CLARAMENTE. É preferível dizer “Fico contente por teres emprestado o teu carrinho ao outro menino” em vez de “Muito bem!”.
Quando o mau comportamento se torna persistente, pode ser útil “importar” algumas das estratégias da Psicologia, nomeadamente da área cognitivo-comportamental: os calendários. Elabore um calendário e afixe-o na porta do frigorífico. Diariamente atribua um símbolo ao comportamento da criança (por exemplo, usando o sol, a nuvem e a chuva). Defina – e explique claramente – o que espera do seu filho. É importante definir um esquema de castigos e recompensas justo e consistente.
Outra das estratégias que recomendo com frequência é o timeout, normalmente como resposta às famigeradas birras. A ideia é definir um local da casa – normalmente o quarto – onde a criança deve ficar durante alguns minutos e acalmar-se SOZINHA. De um modo geral, aplica-se um minuto por cada ano da criança. Claro que, se o objectivo é ignorar a birra e forçar a criança a reflectir sobre o seu comportamento, o local escolhido não deve ter televisor ou computador. Como sempre, é preciso que os filhos acreditem no que os pais dizem, pelo que se o pai ou a mãe lhe disser para ir para o quarto e ficar ali até que o chamem, deverá manter-se firme.
Lembre-se de que a sua credibilidade nestas matérias vale ouro. Assim, frases como “Se voltares a atirar os talheres para o chão, NUNCA MAIS vês televisão” podem minar a sua autoridade. Definir castigos e recompensas REALISTAS é a única via para o sucesso (leia-se, para ser respeitado).