Aquilo que cada um de nós escreve, nomeadamente aquilo que registamos em forma de desabafos diários, dirá com certeza muito acerca do nosso estado emocional. Qualquer psicólogo treinado é capaz de analisar os registos escritos dos seus pacientes e, a partir daí, estruturar uma entrevista terapêutica que lhe permita realizar uma avaliação rigorosa da sua situação clínica. Mais: a terapia narrativa, de que já aqui falei, é particularmente eficaz na estruturação das nossas emoções.
Quando alguém escreve diariamente (ou pontualmente) no seu blogue, utiliza um filtro – cada um expõe aquilo que entende, revelando apenas uma pequena parte de si ou expondo a maior fatia da sua vida. Nalguns casos, esta escolha é consciente e rigorosa, noutros nem tanto. Mas, independentemente daquilo que cada pessoa escolhe partilhar, a verdade é que, de um modo geral, acaba por revelar mais de si do que inicialmente supusera. E não será preciso ser-se psicólogo para “ler nas entrelinhas” e reconhecer emoções por detrás de algumas frases.
Mas quão confortáveis nos sentiríamos se alguém se assumisse capaz de avaliar o nosso estado emocional a partir de um programa informático que analisa o conteúdo dos blogues? Será fiável uma ferramenta como esta? O software existe, foi desenvolvido numa universidade em Israel e “promete” ser capaz de indicar o estado emocional de determinado blogger a partir da identificação da linguagem usada nos respectivos posts.
A ferramenta já foi testada em mais de 300 mil blogues de língua inglesa, contando com a validação de um painel de 4 psicólogos clínicos, que analisaram a amostra. Foi elaborada uma lista dos 100 bloggers mais deprimidos e outra com os 100 bloggers menos deprimidos e haveria uma correlação de 78% entre estes resultados e a análise realizada pelos psicólogos.
O programa foi construído com o objectivo de identificar conteúdo depressivo oculto na linguagem usada nos blogues. Não se trata de reconhecer expressões como “depressão” ou “suicídio”. Trata-se, isso sim, de identificar palavras que expressam um conjunto vasto de emoções e que os bloggers usam para metaforicamente descrever determinados episódios.
A apresentação dos resultados desta pesquisa será formalmente apresentada este Verão e não creio que possamos, para já, olhar para esta ferramenta como um recurso absolutamente fidedigno. Mas, e reconhecendo que existem milhares de pessoas em Portugal (e milhões em todo o mundo) com transtornos depressivos subdiagnosticados e subtratados, não deveremos menosprezá-la. O software permitir-nos-ia identificar mais rigorosamente as pessoas que podem estar a precisar de uma intervenção especializada, mas será sempre impossível substituir a avaliação de um médico ou de um psicólogo pela análise de um programa informático.