Alguns dos casais que me procuram no sentido de dar a volta às dificuldades que estão a ameaçar a sua relação conjugal têm filhos pequenos e, destes, muitos referem-se a dificuldades relacionadas com o adormecimento das crianças. Como se não bastasse os problemas relacionais quase sempre marcados por dificuldades de comunicação e insegurança, acresce o cansaço provocado por noites mal dormidas, tentativas mal sucedidas de implementação de regras, troca de acusações e sentimentos de culpa.
Cada adulto dá o seu melhor no sentido de garantir que a criança se sinta amparada e reagirá com maior ou menor tolerância ao choro associado à dificuldade da criança dormir sozinha no seu quarto. Nalguns casos, o problema prolonga-se no tempo e, vencidos pelo cansaço, alguns adultos optam por adormecer no quarto da criança ou por trazê-la para a sua cama, adiando a resolução do problema. Como esta não é uma solução que contribua para a segurança da criança a médio prazo, mas sobretudo porque as dificuldades têm quase sempre uma origem mais abrangente, o mal-estar eterniza-se e os ciclos viciosos instalam-se.
Aquilo que muitos casais ignoram é que, à excepção de algumas situações clínicas específicas, estas dificuldades podem estar relacionadas com os problemas do casal, já que a criança tenderá a sentir-se mais insegura num ambiente familiar instável e esta insegurança traduzir-se-á no sono.
Para além da implementação de regras específicas que permitam que as crianças façam uma higiene do sono ajustada e adquiram hábitos saudáveis, é fundamental que os pais se voltem para as necessidades emocionais dos seus filhos à hora de deitar. Afinal, esta é a grande separação do dia entre pais e filhos e é natural que haja alguma resistência. Se houver dificuldades conjugais, a insegurança será ainda maior.
Mas o que significa estar atento às necessidades emocionais da criança nesta fase do dia? As crianças lançam-nos muitas deixas e nós, adultos, nem sempre as agarramos. Se estivermos submersos nos nossos próprios problemas, este desafio é ainda mais difícil. Responder apropriadamente a estas deixas implica perceber quando a criança mostra desinteresse numa actividade que lhe é proposta ou pura e simplesmente identificar um olhar diferente.
Um exemplo desta competência específica é visível numa mãe que amamenta o seu bebé de pouco mais de seis meses: ela fala com a criança durante a amamentação, respondendo às suas vocalizações. Estabelece contacto visual com o bebé e quando este “fala”, a mãe diz coisas como “O que é, meu bebé?”.
Num exemplo de inaptidão outra mãe interage com o seu filho de 2 anos usando frases austeras enquanto tenta ler-lhe um livro. Sempre que a criança tenta levantar-se para fazer outra coisa qualquer, a mãe dirige-se a ela tentando travá-la e pedindo-lhe que esteja atenta à história, ignorando no entanto os sinais de desinteresse manifestados pelo filho. Resultado: a criança levantou-se e saiu do quarto uma série de vezes antes de adormecer, transformando o final do dia num momento extenuante par ambos.
Voltarmo-nos para as necessidades emocionais da criança não implica fazer-lhes todas as vontades. Implica, sim, ampará-las, tirar partido da comunicação para transmitir segurança emocional. Na prática trata-se de sermos capazes de transmitir a mensagem “Estou aqui, estou atento(a) e quero que te sintas seguro(a)”. Estarmos emocionalmente disponíveis – prestando atenção às deixas da criança e respondendo de forma ajustada – é a maneira mais eficaz de promover hábitos de sono saudáveis.