Quando alguém ouve falar numa situação de violência doméstica, a indignação é o sentimento predominante, imediatamente seguida de perguntas como “Porque é que ela não o deixa?” ou “O que é que a liga a um homem capaz desta violência?”. Quem trabalha directamente com casos de violência física e emocional sabe com certeza que muitas destas situações se arrastam ao longo de anos e que, mesmo que haja riscos para a integridade física da mulher, a separação nem sempre é equacionada. Por motivos que se prendem com dificuldades financeiras, mas também com a baixa auto-estima destas vítimas e até com a vontade de garantir aos filhos a oportunidade de crescer com o pai e com a mãe, muitas são as mulheres que adiam a retirada.
Hoje sabemos que, mesmo para aquelas que ganham coragem e decidem sair de uma relação marcada pela violência, o período pós-separação é tudo menos fácil. Na verdade, os dois primeiros anos após a ruptura são de tal modo stressantes que um número considerável destas mulheres apresenta transtornos depressivos e ansiosos, tal como se se mantivesse na relação com o agressor. Os casos mais graves são os das mulheres que se sentem completamente desapoiadas por familiares e amigos.
Para quem está de fora, a separação pode ser vista como o fim do tormento. Mas acreditar que o divórcio é a garantia de felicidade é mera ilusão, já que a maior parte destas mulheres acaba por ser forçada a manter algum contacto com o agressor, até em função da guarda dos filhos. Cerca de metade destas mulheres vê o ex-marido pelo menos uma vez por semana. Para além disso, o facto de deixarem de contar com o suporte financeiro do cônjuge e de terem de assumir responsabilidades numa família monoparental implicam o aumento dos níveis de ansiedade.
A juntar a toda esta pressão, a violência nem sempre termina com a ruptura conjugal. Algumas mulheres continuam a ser fisicamente agredidas e/ou ameaçadas. Cerca de 90% destas mulheres são alvo de violência emocional, que corrói a sua auto-estima e aumenta a probabilidade de se deprimirem, mas que não deixa marcas palpáveis, pelo que é ainda mais difícil de gerir.
Assim, é precisamente quando a mulher decide avançar para a separação que os familiares e amigos devem reforçar a sua presença. Não é fácil encarar um processo destes, mas com apoio emocional e perseverança tudo se consegue. Importa lembrar que, independentemente destas dificuldades, a longo prazo as consequências são normalmente positivas e que, em muitos casos, sair de uma relação violenta é, sobretudo, uma questão de sobrevivência, quer da mulher, quer das crianças envolvidas.