A palavra assusta. Tememo-la, tememos proferi-la, quase como se a verbalização pudesse atrair os piores cenários. Mas o cancro anda nas bocas do mundo. Mesmo para aqueles que nunca conviveram de perto com a oncologia, é fácil identificar um familiar ou conhecido que esteja ou tenha estado a lutar contra uma das formas da doença. Felizmente, o cancro já não é sinónimo de morte e as intervenções clínicas alimentam cada vez mais a esperança dos doentes e suas famílias. Mas continua a ser uma doença que amedronta, que abate, que deprime. Como já tenho referido aqui, e ao contrário do que algumas pessoas suporão, nem todos os pacientes oncológicos encaram a doença com abatimento e prostração. Nem todos se deprimem com o diagnóstico. Alguns mostram até uma força invulgar. Outros são surpreendentemente optimistas.
Há algum tempo que nos habituámos a ouvir que a atitude do doente é um factor importante no sucesso do tratamento e que, pelo contrário, a depressão agudiza o sofrimento e potencia a força do "bicho". Mas nem todas as pessoas se referem a estas questões de modo fundamentado. Falam em optimismo como se este fosse meio caminho para a cura, o que também implica riscos, nomeadamente ao nível da comunicação e da capacidade para empatizar com o sofrimento dos doentes.
Sendo uma doença que está quase sempre associada à dor física e a tratamentos agressivos (70 por cento dos doentes que morrem de cancro experimentam dores que não passam com medicação), é natural que muitos se tornem vulneráveis a transtornos depressivos e ansiosos. E é aqui que a intervenção psicológica se torna imprescindível. É que a depressão e a ansiedade comprometem o sucesso do tratamento.
Cerca de 25 por cento dos doentes oncológicos desenvolvem um transtorno ansioso, sendo que 3 por cento sofre de perturbação pós stress traumático. Muitos pacientes desenvolvem fobias (como a fobia às agulhas), ataques de pânico e ansiedade antecipatória e estas situações clínicas podem escalar muito rapidamente, comprometendo o próprio tratamento, já que alguns destes doentes são incapazes de sair de casa (em função dos elevados níveis de ansiedade).
Também a depressão condiciona negativamente a capacidade de resposta destes doentes e influencia o rumo do tratamento. Uma investigação recente com doentes com cancro nos intestinos mostrou que a depressão diminui as hipóteses de sobrevivência destes pacientes. As pessoas que não desenvolvem transtornos depressivos estão mais aptas a procurar informação sobre o diagnóstico oncológico, ouvem segundas opiniões, analisam diferentes planos terapêuticos e cuidam-se melhor do que os doentes deprimidos. Em suma, a depressão contribui para que o paciente oncológico sinta que não tem qualquer controlo sobre a doença. Curiosamente, este estudo também mostrou que não existe qualquer correlação entre o pensamento optimista e a taxa de sobrevivência, isto é, acreditar simplesmente que tudo vai dar certo não tem influência no sucesso do tratamento.
Por tudo isto, parece evidente que os profissionais de saúde que acompanham estes doentes devem atentar à avaliação rigorosa do seu estado emocional, realizando o encaminhando devido para consultas de saúde mental. O tratamento ajustado dos transtornos depressivos e ansiosos potenciará o sucesso na batalha contra o cancro.