A infidelidade faz parte do meu quotidiano enquanto terapeuta conjugal – lido com ela, com os dramas que lhe estão associados e com os rostos do problema todos os dias. E quase todos os dias reconheço nestes rostos interrogações como “Onde é que eu errei?”, “Como é que isto nos foi acontecer?” ou “O que é que eu podia ter feito para evitar esta situação?”.
Tal como tenho tentado expor ao longo deste blogue, a infidelidade pode assumir contornos diferentes de casal para casal. Já aqui falei até dos diferentes “tipos” de infidelidade, com base nos motivos que levam ao afastamento dos membros do casal e ao aparecimento de uma terceira pessoa. Mas todas as relações extraconjugais acontecem em função da desconexão entre os membros do casal. É verdade que nenhum casamento é um paraíso constante e que todos os casamentos (sim, todos) atravessam períodos de menor ligação emocional. Até nas relações mais estáveis existem momentos em que os cônjuges se sentem emocionalmente desconectados. Mas a partir do momento em que esta desconexão se prolonga no tempo sem que nada seja feito, o casal passa a estar vulnerável ao aparecimento de uma terceira pessoa.
O que significa sentirmo-nos emocionalmente ligados ao nosso cônjuge? Significa que:
- Somos capazes de perceber se ele(a) teve um dia bom ou um dia mau pela expressão com que entra em casa;
- Conhecemos os seus amigos mais próximos e as pessoas que ele(a) não suporta;
- Sabemos o que se passa no trabalho;
- Conhecemos as preocupações relacionadas com a família alargada;
- Somos capazes de identificar os seus sonhos mais arrojados e os projectos a curto prazo;
- Sabemos o que o(a) faz feliz, o que o(a) entristece e aquilo de que tem medo.
O que é que pode abalar esta ligação? Existem eventos no ciclo de vida de um casal que podem contribuir para o afastamento emocional de duas pessoas que se amam:
- O nascimento dos filhos;
- A perda de um familiar;
- O desemprego;
- Uma doença grave.
Além disso, sempre que os membros do casal deixam de investir em períodos a dois, em que possam namorar e conversar, cresce a probabilidade de se sentirem desconectados. O mesmo acontece quando pelo menos um dos cônjuges deixa de olhar para o casamento como a sua prioridade, permitindo que outras áreas da vida se sobreponham à família.
Então, o que é que está ao nosso alcance para evitar que a desconexão dê lugar ao fosso e à infidelidade? Em primeiro lugar, é preciso que a relação seja a nossa prioridade e que, independentemente das adversidades, haja sempre tempo para usar a dois. Depois, e porque o conflito faz parte da maior parte dos casamentos, é preciso enfrentar as dificuldades através do diálogo sincero e procurando cuidar das necessidades do outro. Se permitirmos que o ressentimento cresça, é relativamente fácil começarmos a sentir-nos incompreendidos, em vez de tentarmos colocar-nos na pele do cônjuge.
Mas mesmo que sigamos estes passos é possível que nos confrontemos com a sensação de que a ligação emocional já não é a mesma de outrora. Como referi antes, essa desconexão é normal, mas deve ser resolvida. A primeira coisa a fazer é precisamente reconhecer que ela existe, assumir o problema. Depois é preciso enfrentá-lo, falar abertamente sobre o que sentimos, evitando atacar ou culpar o cônjuge. Juntos, os membros do casal podem estruturar recursos que lhes permitam reconectar-se. E, se se sentirem incapazes de o fazer sozinhos, podem (e devem) recorrer à terapia de casal. Quanto mais cedo se intervier, maior a probabilidade de sucesso.
Importa lembrar que, se nada for feito, a desconexão estender-se-á ao longo de muito tempo, tornando-se mais fácil para cada um dos membros do casal encontrar uma ligação emocional com alguém fora do casamento.