Os casos a que me refiro no título deste texto dizem respeito a todas as pessoas que foram surpreendidas com uma separação com que não contavam. E são muitos os relatos com que me confronto no consultório. São pessoas que, tantas vezes da noite para o dia, passaram de um estado de tranquilidade ao desespero e à angústia de não saber como será o seu futuro. Na maior parte destes casos o que acontece é que a pessoa que agora anuncia que se vai embora passou meses (ou anos) a desligar-se do parceiro, atingindo o estado de divórcio emocional. Conteve as suas emoções, a dimensão da sua insatisfação, fazendo o seu luto ainda durante a relação. É por isso que quando o anúncio é feito a pessoa que quer acabar está normalmente serena, segura da sua decisão, por oposição ao cônjuge que, de repente, fica sem chão.
A desorientação de quem num dia acha que tem uma família estável (mesmo que com dificuldades) e no outro está desamparado, atónito com a perda abrupta do companheiro, pode dar lugar à sensação de profundo fracasso, depressão e ansiedade. Este desnorte é compreensível. Na prática, é como se esta pessoa tivesse enviuvado de repente só que o companheiro está vivo e quer ir embora. Nalguns casos a surpresa e a inexistência de tempo para fazer o luto levam a que a pessoa que é abandonada assuma alguns comportamentos obsessivos, numa tentativa desesperada de manter o outro a seu lado. Claro que este padrão comportamental é disfuncional, empurra ainda mais o outro para fora da relação e coloca em risco a saúde emocional da pessoa que fica.
Todas as pessoas são capazes de sobreviver (e crescer) ao fim de uma relação, pelo que, por maior que seja o sofrimento e a surpresa, importa que quem foi abandonado assuma que o melhor é deixá-lo(a) ir. Fazer esforços avulsos para manter a ligação acabará por agudizar e prolongar indefinidamente o sofrimento da pessoa abandonada, pelo que importa que, com a ajuda de familiares e amigos próximos, se possa pôr em prática algumas estratégias para que o luto comece a ser feito e que passam por comportar-se como se o relacionamento tivesse MESMO acabado, ainda que na sua cabeça o vínculo continue a existir:
- retire as fotografias a dois das molduras de casa, apague as fotos que tem no telemóvel e arquive as fotografias do computador;
- deixe de telefonar ao ex-companheiro, evite quaisquer esforços para saber do seu paradeiro e/ou para se sentir mais próximo(a);
- preencha as noites livres e os fins-de-semana com saídas com amigos, actividades individuais ou qualquer outro "programa" que lhe permita sentir-se menos só;
- anuncie às pessoas próximas a separação - não viva sob uma mentira e, acima de tudo, não mascare a sua dor. Permita que as pessoas que estão à sua volta o(a) ajudem.
O sofrimento não passa de forma imediata só porque a pessoa assume que está separada mas este é um passo significativo para o luto. Se a pessoa se comportar como se estivesse desligada do outro, mais dia, menos dia, acabará mesmo por sentir-se desligada e pronta para reconstruir a sua vida.