Estes episódios de doença física são comuns a quase todas as
crianças, pelo que, por maior que seja a angústia dos pais, há sempre alguém
experiente por perto que transmite calma e passa a mensagem de que o mal-estar
vai passar. Porque tudo passa. Mas nenhum pai ou mãe está à espera que o seu filho
adoeça do ponto de vista psicológico, pelo que a depressão nas crianças e jovens é muitas vezes subdiagnosticada.
Em muitos casos, em particular em crianças pequenas, os sinais de alerta são
pouco claros, na medida em que a depressão se manifesta de forma atípica, confundindo-se facilmente com dificuldades de
outra ordem. Noutros casos os sinais estão todos lá mas os adultos ignoram-nos
- não por negligência mas porque ninguém
está preparado para reconhecer que o seu filho, ainda tão pequenino, possa sofrer
de uma doença que nos habituámos a atribuir aos adultos. Se a criança ou
adolescente chora por tudo e por nada é mais fácil supor que teve um desgosto
amoroso ou está a fazer birras por um motivo fútil qualquer. Se há resistência
em ir à escola é porque ele(a) passou a ser preguiçoso(a). Se o filho se mostra
incapaz de dormir sozinho e salta para a cama dos adultos é porque é mimado e
está com dificuldade em crescer. Se há alterações súbitas de humor e/ou
irritabilidade constante é sinal de insolência ou mau-feitio. Se a criança ou
adolescente se queixa porque ouve barulhos esquisitos durante a noite é porque
está a querer chamar a atenção. Se há alterações do apetite é porque está com a
mania das dietas. E por aí fora.
A verdade é que cada pai ou mãe ama demasiado os seus filhos para
reconhecer numa fase precoce o aparecimento da doença. De um modo geral,
passam-se vários meses (às vezes anos) até que os pais assumam que as dificuldades são reais, não podem ser
atribuídas ao desenvolvimento e precisam de ser, pelo menos, avaliadas por
alguém clinicamente experiente.
Nem todos os clínicos estarão aptos a reconhecer os sinais de
depressão em crianças e adolescentes mas uma avaliação rigorosa - realizada por um pedopsiquiatra e/ou por um
psicólogo infantil - permite imediatamente que a família se sinta ajudada e
que a luz comece a visualizar-se ao fundo do túnel. Depois do diagnóstico podem
surgir outros problemas, na medida em que os pais tendem, por um lado, a querer
perceber a origem da doença (e isso pode passar por atribuir culpas injustamente), e, por outro, a mostrar grande
resistência à intervenção farmacológica. Compete naturalmente ao médico que
acompanha a criança esclarecer os pais a respeito das vias mais seguras para
promover uma recuperação rápida e sólida aos seus filhos. A ideia de que o
próprio filho possa ter adoecido sem que haja qualquer evento traumático
identificável associada à necessidade de tomar um antidepressivo é
contranatura, assustadora, impactante. Mas a verdade é que a depressão é uma doença
com origem multifactorial, que nem
sempre está associada a uma reacção a um acontecimento específico e que,
para ser tratada, depende quase sempre da combinação de medicação
antidepressiva com psicoterapia. Quando o problema é gerido como em qualquer outra
situação de doença, isto é, com informação rigorosa, confiança nos médicos e
cumprimento das prescrições, a depressão é tratada e a família readquire o
bem-estar.