a
respeito dos planos que fazemos nesta altura do ano
e que tantas vezes
ignoramos no resto do tempo.
- Quais serão as resoluções de Ano Novo mais típicas/comuns?
As resoluções mais comuns dizem respeito a mudanças profissionais,
implementação de um plano de exercício físico, poupanças, hábitos de leitura e
alimentação. No final do ano é usual aproveitarmos o fechamento de um ciclo (e
o início do outro) para nos comprometermos com mudanças que são
reconhecidamente positivas, dependem essencialmente de nós mas que requerem
esforço e disciplina. Quando uma pessoa se sente insatisfeita em termos
profissionais, é natural que olhe para o novo ano como a oportunidade certa para
dar início a um conjunto de estratégias que permitam mudar de vida. E o mesmo é
verdade no que diz respeito aos hábitos alimentares e ao exercício. Pensar na
saúde, no corpo e nas melhores formas de nos mantermos satisfeitos connosco
implica uma reflexão sobre aquilo que é preciso mudar. Por outro lado, a
viragem do ano é um período propício a balanços sobre o sentido da vida e sobre
a forma como queremos passar o nosso tempo, pelo que é natural que surjam
algumas reflexões acerca da possibilidade de dar início a uma poupança que
permita fazer “aquela” viagem ou a respeito da gestão da agenda necessária para
que antigos hábitos de leitura possam ser recuperados. De um modo geral,
comprometemo-nos com a diminuição da procrastinação e com o aumento da focalização
nos objetivos.
- E quais serão as que temos mais tendência para falhar/abandonar?
No limite, podemos abandonar quase todas e chegar ao fim do ano
com a sensação de que “agora é que é”. A verdade é que a maior parte destas
resoluções envolvem compromissos que não são fáceis de manter, quer por
preguiça e falta de disciplina, quer por medo. De resto, quando procrastinamos,
isto é, quando adiamos tarefas importantes substituindo-as por outras mais
agradáveis, agimos quase sempre movidos pelo medo de falhar. É verdade que as
questões relacionadas com a motivação e a autoestima têm aqui um papel fundamental. Quanto menos seguros nos sentirmos
a respeito das nossas capacidades, maior será a probabilidade de desistirmos
aos primeiros obstáculos. Nesse sentido, os esforços relacionados por exemplo
com a implementação de dietas são muito difíceis de manter na medida em que os
resultados não raras vezes tardam em aparecer.
- Que tipo de emoções tomam conta de nós nesta época e que nos
levam a esta tendência natural para querer mudar tudo o que está mal na nossa
vida?
Funcionamos em ciclos e, do mesmo modo que é usual fazermos
algumas reflexões aquando do nosso aniversário, é expectável que o façamos
nesta altura do ano. Trata-se de olhar para trás, identificar os erros/
insatisfações e aproveitar o início de um novo ciclo para injetar motivação. Sentimo-nos sobretudo esperançosos e acreditamos que
somos capazes. Por outro lado, é comum depararmo-nos com a sensação de que o
ano que agora termina passou “demasiado depressa” e isso leva-nos
frequentemente ao confronto com a finitude da vida e com o caráter efémero da nossa jovialidade. Olhar para o novo ano como uma
oportunidade de mudar é sobretudo depositar em nós mesmos a capacidade de tomar
as rédeas da própria vida.
- E porque é que não podemos ter o mesmo espírito de iniciativa e
força de vontade a meio do ano, por exemplo?
À medida que retomamos a maior parte dos nossos compromissos e
afazeres, acabamos por remeter-nos às nossas rotinas e é relativamente fácil
sujeitarmo-nos à azáfama diária sem que paremos para pensar no que está mal.
Adiamos de forma sistemática os nossos sonhos enfiando a cabeça no trabalho,
nos filhos, na lida da casa.
- Acha que este hábito de fazermos planos que não tencionamos (ou
não conseguimos) cumprir é algo positivo que nos alimenta a esperança, ou pelo
contrário, é negativo porque nos mostra que afinal não somos capazes de atingir
certos objetivos?
É positivo na medida em que nos lembra de algo extremamente
importante: não podendo mudar os outros, é possível mudarmos quase tudo na
nossa própria vida e, assim, elevar os níveis de bem-estar. O grande problema
reside precisamente na reflexão a propósito do que nos faz falta, do que
precisamos para sermos felizes. Não raras vezes tentamos enganar-nos a nós
próprios, iludimo-nos, e o esforço começa imediatamente condicionado. Mas a
verdade é que o “empowerment” psicológico, isto é, a crença de que somos
capazes de mudar, é uma competência muito importante.
- De que forma é possível gerir a noção da realidade, do possível
e do concreto quando elaboramos os nossos objetivos? Por exemplo, valerá a pena
pensar em concretizar algo completamente inatingível, sendo que as nossas
expetativas sairão muito provavelmente frustradas?
A questão passa mesmo pelas expectativas. Ao depositarmos toda a
nossa felicidade em bens materiais ou até mesmo em mudanças no nosso corpo,
esquecemo-nos de que o essencial são os laços afetivos. Assim, ainda que demos o nosso melhor no sentido de cumprir os objetivos, corremos o risco de nos sentirmo frustrados por não estarmos
realmente a perseguir os sonhos que contribuiriam para a elevação do nosso
bem-estar.
- Qual a melhor forma de lidar com a frustração de perceber que a
“lista” de resoluções do ano anterior não foi cumprida?
Lidar com a frustração faz parte do processo de amadurecimento.
Depois do insucesso importa arregaçar as mangas e voltar a tentar. As pessoas
mais resilientes, isto é, aquelas que não se vergam perante as adversidades,
são mais otimistas, mais perseverantes e, de um modo geral, saem vencedoras. Nem
tudo é alcançado à primeira tentativa e é o facto de continuarmos a tentar que
nos mantém vivos.
- Há alguma forma de tentar assegurar que cumprimos a maior parte
das nossas resoluções de Ano Novo, ao género de incentivo (um esquema de
autorrecompensa, associarmo-nos a um amigo, colocá-los por escrito…)?
A monitorização dos nossos esforços por escrito, colocando por
exemplo uma tabela na porta do frigorífico, e um sistema de castigos e
recompensas podem ajudar, tal como pode ser útil pedir ajuda a um familiar ou a
um amigo para essa monitorização.
- E quanto às resoluções não cumpridas, será melhor “abandoná-las”
por completo e não as incluir na “lista” do próximo ano, para não correr o
risco de voltar a falhar, ou vale sempre a pena tentar de novo?
Querer é poder. Gerir as expectativas não deve passar por colocar
de lado sonhos que dependem maioritariamente de nós. Nesse sentido, há
resoluções que devem mesmo transitar de um ano para o outro, sem que isso
implique qualquer sensação de fracasso.