"Ele deixou de prestar atenção ao que eu dizia, deixou de mostrar interesse, descurou a nossa relação... Foi isso que me empurrou para uma relação extraconjugal".
"Ela estava sempre a implicar comigo. Parecia que só estava bem se
estivéssemos a discutir. Essa foi a causa da minha infidelidade".
Quem já ouviu histórias de
infidelidade com certeza que já terá ouvido relatos desta natureza, ainda que
seguidos de frases como "Claro que
isso não desculpa o que eu fiz". Que relação existe, afinal, entre os
problemas no casamento e as relações extraconjugais? Será que podemos dizer que
há uma relação de causa-efeito? Serão os problemas no relacionamento
responsáveis pelo surgimento de um affair? Ou será a relação extraconjugal a
origem dos problemas? E até que ponto é possível que haja infidelidade num
casamento saudável?
Em primeiro lugar, é óbvio que a
infidelidade vai criar problemas sérios à relação, independentemente dos que
pudessem existir antes. Por outro lado, na maior parte dos casos é possível
identificar dificuldades no relacionamento que abriram espaço ao aparecimento
de uma terceira pessoa. Mas isso não
significa que todos os casamentos em crise estejam em risco de passar por uma
infidelidade. Importa sublinhar que, mesmo que haja níveis de tensão/
distanciamento/ insatisfação muito elevados, existem respostas alternativas e
que a infidelidade só acontece se um dos
membros do casal ESCOLHER ser infiel. Ser infiel, na verdade, não resolve
nada. É só uma forma de fugir à solidão, à tristeza ou à insatisfação conjugal.
Mas por que é que duas pessoas
que se amavam começam a distanciar-se?
O distanciamento pode resultar da
incapacidade para resolver os conflitos, da falta de intimidade ou pura e
simplesmente da falta de investimento na relação. E esse é um terreno suficientemente
fértil para que um colega, um amigo ou alguém com quem um dos membros do casal
se cruze regularmente passe a ser olhado de outra forma. Na maioria das vezes a infidelidade surge com colegas de trabalho -
precisamente em função da proximidade física regular - mas até um desconhecido
que lance um elogio no autocarro pode transformar-se numa nova paixão.
Há outros casos em que a
infidelidade surge quando um dos membros
do casal está deprimido. Nestas situações é difícil perceber se a depressão
surgiu na sequência dos problemas no relacionamento ou se o distanciamento
entre os membros do casal é que resultou do estado depressivo de um deles.
Nestes casos importa, antes de mais, tratar a depressão de forma ajustada - com
psicoterapia e medicação.
Existem muitas relações
extraconjugais associadas a períodos de viragem. Não é por acaso que há muito
se ouve falar nos affairs associados a
crises de meia-idade. Na verdade aquilo que acontece é que, de vez em
quando, damos por nós a fazer balanços, a olhar para trás para avaliar as
escolhas que fizemos e, quando esse balanço equivale sobretudo à sensação de
vazio, a probabilidade de haver uma relação extraconjugal é maior. E isso é
ainda mais provável se à volta da pessoa que escolhe ser infiel houver pessoas
com o mesmo padrão comportamental. É como se esses exemplos dessem força à
pessoa, diminuindo os sentimentos de culpa.
Também importa esclarecer que até os casamentos felizes podem ser
atingidos pela infidelidade. Pessoas satisfeitas com a sua relação podem
surpreender-se com o interesse súbito numa terceira pessoa - normalmente alguém
próximo. A verdade é que uma amizade pode evoluir para uma relação amorosa
quando se passa a partilhar regularmente histórias de vida, sentimentos e
assuntos íntimos com outra pessoa. Se não houver fronteiras claras em relação
ao exterior, se não houver regras bem definidas no que toca ao relacionamento
de cada um dos membros do casal com colegas e amigos, até as pessoas mais
íntegras podem cair nas malhas da traição.
Em nenhuma destas situações se pode dizer
que foi um mau casamento que deu origem à infidelidade.
Um mau relacionamento pode constituir
terreno fértil para as relações extraconjugais
mas a escolha é sempre de quem trai.