Todos os anos somos confrontados com os números divulgados por associações de apoio à vítima. Todos os anos nos sentimos chocados com o facto de haver mulheres que continuam a morrer nos braços de um cônjuge violento. Todos os anos – pelo menos na última década – ouvimos dizer que a violência não é só física e que a escalada começa quase sempre pelos abusos psicológicos. Ainda assim, as relações amorosas marcadas pelos maus-tratos continuam a existir e as campanhas de informação parecem atingir apenas aqueles que não precisam delas.
Um dos motivos por detrás da
tragédia destes números está relacionado com a falta de autoconfiança e de
autoestima destas mulheres. Afinal, por detrás de carreiras de sucesso e
imagens imaculamente tratadas estão tantas vezes feridas emocionais profundas,
que perduram no tempo e que as impedem de fazer o que tem de ser feito. Os
factos são quase sempre os mesmos e em cada história só muda o nome dos
protagonistas:
Os abusos acontecem dentro de casa.
O agressor nega os seus atos.
O agressor culpa a vítima (e consegue que esta se sinta culpada).
Os abusos verbais deterioram gradualmente a autoestima da vítima.
QUEM SÃO ESTES AGRESSORES?
Por incrível que
possa parecer, são quase sempre:
Inseguros
Carentes
Desconfiados
Ciumentos
Controladores
Incapazes de assumir
a culpa/ responsabilidade.
Como não conseguem assumir a sua
insegurança, muitas vezes é difícil perceber que se sintam impotentes. Aquilo
que se vê (ou aquilo que a vítima experimenta) é uma necessidade constante de
exercer poder, de controlar tudo.
COMO É QUE AS VÍTIMAS CAEM NA ARMADILHA DO AGRESSOR?
Na violência emocional tudo gira
em torno da comunicação e para o agressor o que importa é ganhar. As vítimas
normalmente reagem às críticas/ acusações tentando explicar-se, como se o
agressor estivesse realmente interessado em ouvi-las. NÃO ESTÁ. O que é que é preciso fazer?
COLOCAR UM TRAVÃO
IMPOR LIMITES
DIZER NÃO.
A maioria das vítimas procura dar
resposta a estes confrontos tentando acalmar o agressor, minimizando os
conflitos. Não resulta. Nunca. Os
abusos vão continuar.
Quem vive numa relação marcada
por abusos tende, infelizmente, a minimizar o problema. São muitos os casos de
mulheres que acompanho em contexto terapêutico que relatam episódios em que o
cônjuge parte objetos, bate com as portas, esmurra o volante do carro ou
pontapeia cadeiras… “Não conseguiu controlar-se mas a verdade é que nunca me
agrediu” – dizem tantas vezes, desculpando-os. Ignoram, por exemplo, que estes
comportamentos não têm lugar noutras relações. A mesma pessoa seria incapaz de
tamanha violência em contexto profissional, por exemplo.
De um modo geral,
estes episódios obedecem a um padrão:
1.º - Escalada de
tensão.
2.º - Comportamento
violento.
3.º - Remorsos e
pedidos de desculpas.
4.º - “Lua-de-mel”.
POR QUE É QUE ESTAS MULHERES AGUENTAM TANTOS ATAQUES?
Em primeiro lugar, porque
acreditam que o agressor é capaz de mudar. Acreditam nas promessas. Afinal de
contas, há momentos bons entre cada episódio de violência. Em segundo lugar,
porque destas relações há muitas vezes crianças que a vítima ACHA que está a
proteger dos danos de um divórcio. Como já tenho tentado enfatizar noutros
textos, há ainda outros motivos que levam a que estas mulheres permaneçam
nestas relações abusivas:
Dependência
financeira.
Não ter para onde ir.
Isolamento social/
inexistência de uma rede de suporte sólida.
Medo de perder a
guarda das crianças.
Como o agressor utiliza a
manipulação para afastar a vítima das pessoas que a poderiam realmente
proteger/ ajudar a quebrar o ciclo vicioso, esta acaba por sentir-se muitas
vezes humilhada mas incapaz de reconhecer uma saída. Como se não houvesse volta
a dar. Mas é possível dar a volta. E o primeiro passo é:
FALAR SOBRE O ASSUNTO.
ASSUMIR O PROBLEMA.
É quase sempre essencial abordar
a questão em contexto terapêutico e, desta forma, dar início à reconstrução –
sólida – da autoestima. Muitas vezes o pedido de ajuda surge antes de a mulher
sair de casa, antes de dizer BASTA. As primeiras consultas decorrem num
ambiente de secretismo, essencial para que ganhem a segurança suficiente para
dar os passos seguintes, munindo-se nessa altura de todos os recursos à sua
disposição – contando à família alargada e aos amigos, denunciando os abusos e
recorrendo ao apoio judicial.
Se a pessoa que está ao seu lado
insiste em fazer SEMPRE as coisas à sua maneira, tem explosões de
agressividade, é rude consigo, critica a sua família e os seus amigos e/ou é
excessivamente desconfiado, ESTEJA
ATENTA. Estes podem ser os primeiros sinais de uma relação abusiva.