A depressão é uma doença que não escolhe idade, sexo, raça nem classe social. Pode atingir qualquer um e as estatísticas mostram que pelo menos um em cada cinco adultos tem ou já teve um episódio depressivo. Nesse sentido, é fácil adivinhar o impacto que esta perturbação tem em termos familiares. Entre estes doentes estão muitos pais e mães, pelo que importa refletir sobre o que acontece aos filhos.
As pesquisas nesta área mostram
uma correlação direta entre a depressão do pai ou da mãe e a
probabilidade
de os filhos desenvolverem alguma forma desta doença ou outras
perturbações do comportamento.
Nestas estatísticas inclui-se a depressão pós-parto mas a verdade
é que quando falamos da depressão do pai ou da mãe falamos de outras formas da
doença que, nalguns casos, assume contornos de doença crónica.
Como é sabido, uma das consequências mais frequentes resultantes
deste adoecimento é a falta de energia. O doente com depressão queixa-se
frequentemente de desmotivação, incapacidade para honrar compromissos, vontade
de ficar quieto, sem fazer nada. Ora, no que diz respeito ao papel parental é
óbvia a diminuição da disponibilidade e
da capacidade para dar atenção às necessidades da criança. Nalguns casos
essa indisponibilidade é generalizável aos cuidados médicos de que a criança
precisa. Não raras vezes, os pediatras são confrontados com o agravamento da
saúde física das crianças, apenas explicável porque o adulto responsável não
foi capaz de identificar a tempo a necessidade de intervenção médica. Por
exemplo, se a criança tiver um problema crónico – como acontece no caso da asma
– um progenitor com depressão pode evidenciar seríssimas dificuldades na
aplicação do plano terapêutico que permitiria que as crises fossem evitadas.
Infelizmente, os médicos nem sempre se sentem confortáveis para
abordar a hipótese de aquele progenitor precisar de ajuda especializada, ainda
que reconheçam que, para ajudar a criança, é fundamental que os pais também
sejam ajudados. A questão é que ainda existe algum estigma associado às
perturbações de humor. Além disso, as idas ao pediatra continuam – infelizmente
– a funcionar como um barómetro das competências parentais. Nenhum pai ou mãe quer ouvir que não está a
cumprir o seu papel. Nenhum pai ou mãe está preparado para qualquer
comentário que se assemelhe a uma avaliação negativa do seu papel parental. E
os pediatras sabem disso.
Mas não há nada de insultuoso ou ofensivo no levantamento de questões
a respeito da saúde emocional dos pais. Pelo contrário, ser pai ou mãe implica
a responsabilidade de reconhecer que o nosso estado emocional condiciona a
saúde – física e emocional – das nossas crianças. Mais: implica que confiemos
na competência dos médicos e que interiorizemos a mensagem de que um pediatra dificilmente
conseguirá ser bem-sucedido na ajuda às nossas crianças se ignorar o contexto
familiar.
Como é que se sentiria se o pediatra do seu filho lhe perguntasse
se está tudo bem consigo do ponto de vista emocional?
Até que ponto se sentiria ofendido se o médico levantasse a
hipótese de o seu estado emocional estar a condicionar a saúde física do seu
filho?
Aceitaria de bom grado a manifestação de preocupação com a
hipótese de você estar deprimido(a)?
É fundamental que os médicos insistam nesta função, nomeadamente
porque as perturbações depressivas e ansiosas SÃO TRATÁVEIS e não há nenhum motivo para que nos escondamos ou nos
envergonhemos. Assumir a necessidade de ajuda especializada pode prevenir a agudização
de determinadas doenças físicas da criança e pode, sobretudo, trazer um alívio
imenso aos pais. Por outro lado, ao conhecer a prevalência de depressão na
família o médico pode estar mais atento aos sinais de depressão na própria
criança. Afinal, esta é uma doença com uma componente transgeracional.