Tal como tenho enfatizado noutros textos, o conflito faz parte das relações afetivas, em particular das relações amorosas. Não sendo expectável – nem saudável – que um casal passe a vida a discutir, também não é positivo que um ou os dois membros do casal assumam uma postura de evitação do conflito. Porquê? Porque, apesar do desgaste, as discussões implicam que cada um tenha oportunidade de manifestar desagrado, permitem que ambos se sintam livres para deitar cá para fora aquilo que os insatisfaz e, claro, permitem que a intimidade emocional cresça.
De um modo geral, as discussões são um ponto
de partida para que cada pessoa se aperceba
dos próprios erros e das necessidades do outro.
Estes aparentes braços-de-ferro
são, muitas vezes, pontos de viragem que permitem que as relações continuem a
evoluir, acompanhando as mudanças por que passam cada um dos membros do casal.
Não consigo conceber duas pessoas
exatamente iguais, cujas ideias convirjam sempre e em todas as matérias (sexo,
dinheiro, sogros, filhos, política, amigos, saídas, tarefas domésticas), pelo
que quando duas pessoas me dizem que NUNCA
discutem, temo que pelo menos uma delas não esteja a ser capaz de verbalizar as
suas reais emoções. Porque é isso que me mostra a experiência como terapeuta de
casais.
Mas se as discussões são – ou podem
ser – o ponto de partida para o crescimento a dois, não há nada de positivo nas
discussões que traduzem apenas níveis elevados de raiva e que teimam em
prolongar-se.
Há uma barreira que separa as discussões destrutivas
daquelas que efetivamente podem contribuir para
o conhecimento mútuo e para a intimidade emocional.
Quando, independentemente do
assunto, a única emoção que conseguimos transmitir ao cônjuge é a RAIVA, é possível que cada discussão
seja apenas a tradução do afastamento que se instalou entre os membros do
casal. Nesses casos, a dificuldade em empatizar com o cônjuge é enorme e é
praticamente impossível discernir sobre o que pode ou deve ser melhorado.
Pelo contrário, quando a raiva se
eterniza, transformando cada discussão numa espécie de batalha em que o assunto
mais trivial pode descambar num rol de insultos, é tempo de dizer:
STOP!
A acumulação de raiva aumenta a
probabilidade de os membros do casal entrarem numa escalada de violência do
tipo “olho por olho”.
Enfrentar os problemas a dois
implica que ambos se manifestem disponíveis para escutar, intervir e permitir
que o outro também intervenha. Infelizmente, um dos erros mais frequentes
consiste em falar ininterruptamente sem permitir que o cônjuge também o faça.
Este vício de comunicação, normalmente marcado por CRÍTICAS FEROZES ao comportamento do outro, constitui mais um
ataque pessoal do que uma crítica construtiva. Por isso, é de esperar que quem
estava habituado a ouvir se sature muito rapidamente.
Gera-se, assim, um ciclo vicioso:
um dos membros do casal ataca o cônjuge,
este defende-se, o que aumenta a hostilidade do primeiro.
O aumento da escalada pode levar
a que o cônjuge que é alvo das críticas se cale, gerando silêncios
ensurdecedores e a sensação (para ambos) de que as discussões não levam a lado
nenhum. Alguns investigadores têm demonstrado que estes erros podem ser fatais,
já que conduzem o casal ao divórcio.