Sente-se farto(a) da maior parte das pessoas à sua volta? Dá por si a revirar os olhos [cheio(a) de impaciência] quando uma dessas pessoas solicita a sua ajuda/ participação numa ou noutra tarefa? Não tem paciência para a agitação das crianças? O trânsito deixa-o(a) à beira de um ataque de nervos?
…É possível que esteja com DEPRESSÃO.
Habituámo-nos à ideia de que
quando as pessoas estão deprimidas passam os dias a chorar, prostradas, pelo
que nem sempre é fácil reconhecer as outras manifestações da doença. Mas, como
tenho tido oportunidade de referir, a
depressão é uma doença incapacitante que pode assumir muitas formas. Nem
todas as pessoas têm a capacidade de exteriorizar a sua tristeza através do
choro; assim como nem todas as pessoas têm a capacidade de identificar os
próprios estados emocionais. Para além disso, assumir a verdadeira raiz dos
problemas implica a assunção de que novas (e difíceis) escolhas têm de ser
feitas. Em função de tudo isto, uma percentagem significativa dos pacientes com
depressão nunca chegam a receber tratamento adequado às suas dificuldades. Ou
recebem-no apenas numa fase tardia – de um modo geral, quando a depressão
atípica escalou, comprometendo ainda mais seriamente as relações sociais e
familiares.
Num quadro de depressão atípica o
paciente reconhece que há dificuldades, sente-se saturado na maior parte do
tempo, mas, tal como acontece noutras formas de depressão, é incapaz de
vislumbrar a luz ao fundo do túnel. Passa a vida a queixar-se – da família, do
emprego, dos colegas, do chefe, dos amigos – atribuindo ao “stress” do
quotidiano as suas explosões. É incapaz de sentir-se genuinamente grato pelas
conquistas feitas até aí, problematiza em excesso, não tem energia para quase
nada e vive numa ânsia constante de fugir, desaparecer, em busca da paz há
muito perdida. Como os milagres (ou o Euromilhões) teimam em não aparecer,
acomoda-se a escolhas que o insatisfazem e que contribuem para a agudização do
mal-estar.
À nossa volta existem muitas
pessoas assim, basta que estejamos atentos.
Em casa, no trabalho, nos transportes públicos,
em centros comerciais, na praia
ou no lugar teoricamente mais relaxante
vamos acabar por encontrar pessoas que “fervem em pouca água”,
que expiram de forma intensa,
como se através da sua boca saísse constantemente
o ar de uma panela de pressão.
Porque é assim que a depressão
atípica se pode manifestar – através da irritabilidade constante, que teima em
prolongar-se no tempo, mesmo que pontualmente haja alguns intervalos de
bem-estar.
Para quem não está deprimido e é
capaz de reconhecer que a vida é MUITO
mais do que isso, é fácil perceber que ALGUMA
COISA tenha de ser feita. Mas para quem se acomodou a viver assim, nem
sempre está claro que estes sejam sinais de doença, pelo que o pedido de ajuda,
além de não aparecer, pode ser encarado como disparatado. “Deprimido(a), EU?
Que ESTUPIDEZ”, pensará a maior parte das pessoas a quem os outros rotulam de
impaciente ou alguém com “mau-feitio”.
É na medida em que cada vez mais
se confrontem com a normalidade dos outros, mas sobretudo com a preocupação e o
cuidado de quem, desejando mais e melhor para si, o(a) incentive a admitir que
a irritabilidade pode ser um sinal de instabilidade emocional, que a pessoa
passa a equacionar a hipótese de ajuda clínica. E, a partir daí, é como se uma
mochila pesadíssima fosse retirada das suas costas.