É cada vez mais frequente vermos à nossa volta mulheres de 35 ou até de 40 anos a engravidarem pela primeira vez. Mas, ainda que se fale regularmente no adiamento da maternidade como o resultado de uma escolha, a verdade é que, em muitos destes casos, houve circunstâncias específicas que impediram que aquele passo fosse dado mais cedo. A reflexão a respeito dos motivos por detrás da suposta opção é ainda mais relevante se tivermos em consideração os juízos de valor que lhe possam estar associados.
Em Portugal, como no resto do
mundo, existe uma pressão social
fortíssima à volta do casamento e da maternidade. Independentemente das
mudanças sociodemográficas ou da suposta evolução do pensamento, continuamos,
de forma às vezes inconsciente, a pressionar quem está à nossa volta com
questões do tipo “Então, quando é que casas?” ou “E quando é que estás a pensar
em ter filhos?” e associamos muitas vezes o adiamento destes passos a atitudes
mais ou menos egoístas, mais ou menos autocentradas.
É como se quem não case/ tenha filhos
antes dos 30 estivesse a
cometer uma falha grave.
A importância do papel parental e
a pressão que lhe está associada são ainda maiores para as mulheres. Sendo
“normal” que um homem se mantenha solteiro depois dos 35 anos, a generalidade
das mulheres nestas circunstâncias são regularmente confrontadas com frases do
tipo “Olha que depois pode ser tarde”, numa alusão clara aos constrangimentos
biológicos que, para as mulheres, podem comprometer a fertilidade. Mais: como
existem riscos associados a uma gravidez “tardia”, não são raros os comentários
– quase sempre à boca fechada – a respeito do egoísmo da mulher.
Aos olhos de quem escolhe ser preconceituoso,
ser mãe depois dos 40 (ou depois dos 35)
é arriscar de forma irresponsável que
o bebé nasça com problemas.
Além disso, são também elas que
mais frequentemente são criticadas quando, em função da perseguição de alguns
objetivos académicos e profissionais, se veem na necessidade de adiar a
maternidade. Egoísmo é a palavra de ordem – mesmo que nem sempre seja
verbalizada em bom som. Continuamos, enquanto sociedade, a atribuir ao papel
parental a importância maior e esperamos que a maior parte das mulheres sejam
capazes dos maiores sacrifícios em nome desse papel, mesmo que isso implique a
anulação de todos os outros.
Sendo esta uma atitude
preconceituosa e antiquada, é, acima de tudo, uma leitura muito superficial de
um problema que, para muitas mulheres, é bastante mais complexo. A verdade é
que nem todas as mulheres “escolhem” ser mães numa fase mais tardia. A verdade
é que ser pai ou mãe depois dos 40 pode muito bem resultar da inexistência de
condições básicas que permitissem que, antes disso, esse passo fosse dado. Para
além do óbvio, isto é, da crise
financeira de que ouvimos falar diariamente e que, em muitos casos implica
que casais REAIS se vejam forçados a adiar um dos seus projetos de vida mais
significativos, existem outras condicionantes. Há mulheres (e homens) que aos
35 ou aos 40 anos ainda não encontraram a tão desejada estabilidade conjugal. Há mulheres (e homens) que, ao contrário do
que acontecia há décadas atrás, colocam um ponto final a um casamento que
apodreceu abdicando, assim, da possibilidade de serem mães (e pais) jovens.
Será esta uma atitude egoísta?
Será esta uma atitude irresponsável?
Não!
Tão-pouco poderemos chamar a isto
escolher adiar a maternidade/ paternidade. Quanto muito, esta é uma escolha
forçada – que não pode (ou, pelo menos, não deve) ser alvo de preconceitos.