Um dos grandes flagelos do século
é, como se sabe, a depressão. Nem todas as vítimas deste transtorno recebem o
tratamento adequado mas, daquelas que chegam ao meu consultório, há muitas
histórias de vida com um elemento em comum – a convivência com um progenitor
alcoólico. Em muitos destes casos, o pedido de ajuda não surge interligado com
o passado mais ou menos violento. Porque tendemos a fixar-nos no aqui e agora,
no que nos corre mal na atualidade, nas desilusões recentes, mais do que a
olhar para trás, para as feridas emocionais que, estando longe de estar
saradas, teimam em condicionar-nos o olhar sobre a realidade e, mais do que
tudo, impedem-nos de viver em paz. Como um processo psicoterapêutico –
individual ou familiar – serve precisamente para que a pessoa possa estruturar
as suas emoções de forma sólida, é com relativa frequência que me deparo com os
traumas associados ao alcoolismo dos progenitores.
Uma das marcas mais profundas
relacionadas com este problema tem a ver com a desorganização familiar que, de um modo geral, decorre da
circunstância de haver um alcoólico em casa (quando não são os dois
progenitores). Essa desorganização – que nuns casos é mais evidente do que
noutros – pode empurrar os filhos para uma espécie de maturidade precoce, que é tudo menos saudável. Muitas vezes sem que
nenhum dos membros da família se dê conta, o filho assume o papel de cuidador
do pai e/ou da mãe e é incapaz, mesmo depois de adulto, de se desvincular desse
papel. Mas aquilo que pode ter funcionado como um mecanismo de sobrevivência
acaba por revelar-se desajustado e comprometedor do bem-estar.
É que, a páginas tantas, o adulto
filho de um alcoólico vê-se a si mesmo como a pessoa que “tem de” continuar a
apagar todos os fogos ou que “tem de” resolver os problemas que não são seus. E
este é um dos desafios destes processos terapêuticos: ajudar aquele adulto a desprender-se de problemas que não são seus para
que, assim, possa viver a SUA vida.
Pelo meio, são
frequentes as queixas de:
insatisfação e/ou desorientação profissional,
problemas no casamento
e dificuldade em manter amizades sólidas.
A pessoa pede ajuda psicológica
numa altura em que a vida parece caótica
(muitas vezes na sequência de uma rutura) e, com a ajuda devida, começa a
perceber a origem das dificuldades. Escolher tratar essas feridas pode implicar
o confronto com algumas mágoas mas representa também a oportunidade de mudar de
vida e ser feliz.