Quem é que não se lembra de no
início de uma relação amorosa ter pensado “Com
esta pessoa é que é! Hei de sentir-me sempre assim, apaixonado(a)”? Ou de
ouvir alguém recém-casado dizer que a sua relação jamais será como as outras,
as que caem na rotina, porque os sentimentos envolvidos são únicos, intensos,
incomparáveis?
Por que tendemos a duvidar das juras de eterna paixão?
Por que abanamos a cabeça ao ouvir alguém profundamente enamorado?
Estarão as relações amorosas condenadas ao esmorecimento?
A razão por que é utópico
considerar que é possível estar permanentemente apaixonado por alguém é a mesma
por que é irrealista pensar que seríamos felizes para sempre se ganhássemos o
Euromilhões. Ou se tivéssemos um emprego muito bem remunerado. Chama-se adaptação hedonista e tem a ver com o
facto de, depois de um acontecimento excecionalmente positivo, mais cedo ou
mais tarde a nossa vida voltar a ser o que era antes, com os mesmos níveis de satisfação
e de insatisfação.
Algumas pessoas passam a vida a
lutar por uma promoção no trabalho. Lutam para a conseguir mentalizando-se de
que quando a alcançarem, e forem remuneradas em conformidade, serão
infinitamente mais felizes e deixarão de se sentir insatisfeitas. Até que um
dia a promoção sai, o entusiasmo dos primeiros tempos confirma as expetativas
e… algum tempo mais tarde as queixas de antes dão lugar a outras quaisquer,
levando tantas vezes a que, quem está à volta, rotule aquelas pessoas de
“permanentemente insatisfeitas”.
Quer isto dizer que é desajustado
definir objetivos e lutar por eles? Claro que não! O que é desajustado é
considerar que só seremos felizes se TODOS
esses objetivos forem concretizados. Tal como é desajustado deixar de definir
objetivos.
Para que nos sintamos vivos, no
sentido de haver entusiasmo nos diferentes papéis que desempenhamos, é preciso que haja por que lutar, é
preciso que sintamos que estamos a trabalhar para alcançar alguma coisa. Na
medida em que não houver objetivos, um rumo, qualquer conquista, por maior que
ela seja, dá lugar ao vazio. É por isso que, para algumas pessoas, é tão
difícil fazer com que uma relação perdure. É que viver sob o fogo da paixão é
relativamente fácil, não requer que a relação seja alimentada. Difícil é o que
vem depois dessa ativação fisiológica.
Manter uma relação para lá dos
dois anos (tempo máximo de duração da fisiologia da paixão) implica que façamos
alguma coisa para ultrapassar a tal adaptação hedonista. É como se o nosso
corpo, ao fim desse tempo, se habituasse àquilo (ou, no caso das relações
amorosas, àquela pessoa) por que lutámos e nos dissesse “Agora quero mais”. Nós precisamos sempre de mais e é fundamental
que o reconheçamos, sob pena de avançarmos para o marasmo.
Uma relação pode ser vivida como
excecionalmente positiva. A pessoa que escolhemos pode ser encarada como “a
tal”. Mas isso não pode equivaler a considerar que não há trabalho pela frente,
que a conquista acabou, que não é preciso fazer mais nada para continuar a ser
feliz. A assunção de uma postura comodista pode levar-nos a constatar, da pior
maneira, que o “TUDO” pode
transformar-se em “NADA”. Infelizmente, vou encontrando alguns casais que
não souberam alimentar a sua relação depois da paixão. Não foram capazes de
definir objetivos a dois. Não foram capazes de perceber que, para continuarem a
sentir-se felizes juntos, teriam de ter por que lutar. Achavam que tinham ganho
o Euromilhões e que isso lhes bastava.