Há quem acredite que são as relações extraconjugais que mais frequentemente destroem um casamento. E até há quem se convença que é à terceira pessoa (o/a amante) que se deve atribuir todas as culpas. Enquanto terapeuta de casais a minha visão sobre estas matérias é muito diferente. Embora reconheça que uma infidelidade é suficientemente devastadora – ao ponto de estar, efetivamente, associada ao fim de muitas relações, esse não é o principal fator por detrás da maior parte das separações. É um acontecimento de peso, na medida em que nem todos os casamentos sobrevivem a tamanho impacto. Mas em muitos casos a infidelidade nem sequer é o único problema, já que surge precisamente numa altura em que os membros do casal já estão distanciados.
Na maior parte das vezes aquilo
que contribui para que os membros do casal se afastem – ao ponto de não haver
volta a dar – não são os “grandes” acontecimentos. São, isso sim, aquelas
pequeninas coisas que vão trazendo desgaste e saturação.
Quais são as
“PEQUENINAS COISAS”
que destroem um casamento?
MÁ COMUNICAÇÃO. Há quem confunda problemas sérios de comunicação
com discussões. Mas a existência de conflitos está longe de ser, em si mesma,
um problema que comprometa a manutenção de um casamento. Em todas as relações –
mesmo nas mais felizes e duradouras – há períodos de maior proximidade e
períodos de maior afastamento. O nascimento de um filho, a mudança de emprego,
o desemprego ou o aparecimento de uma doença são acontecimentos de vida que
podem trazer níveis mais elevados de stress, levando à ocorrência de mais
discussões. Mas na medida em que as pessoas se ouçam, se respeitem e continuem capazes de se comprometer uma
com a outra, os problemas acabam por ser geridos de forma eficaz. É
precisamente a incapacidade (ou falta de
vontade) de nos colocarmos na pele da pessoa com quem estamos casados que pode
levar a um distanciamento irreversível. Manter um casamento implica esse
esforço contínuo, bem como a capacidade (e a vontade) de assumir compromissos.
CONTROLO EXCESSIVO. Em terapia de casal ouço com alguma frequência
queixas associadas a uma certa postura
moralista da parte de um dos membros do casal. Quando alguém se convence
que está quase sempre com a razão e que a sua visão das coisas é “a correta”, é
natural que assuma constantemente uma tentativa de controlar/ condicionar o
comportamento do parceiro. Ainda que este controlo não seja exercido de forma
violenta, é profundamente desgastante. Porque implica que o cônjuge se sinta desrespeitado, desvalorizado, desconsiderado.
Porque dá azo a amuos e braços-de-ferro. Porque, mesmo de forma inconsciente,
há uma pessoa que prefere ter razão a manter uma relação.
PROMESSAS NÃO CUMPRIDAS. Como referi antes, o compromisso é
essencial numa relação. Mas, tal como já tive oportunidade de referir noutras
ocasiões, a capacidade de nos comprometermos é muito mais do que a habilidade
de fazer promessas através de palavras bonitas.
Não significa que quem promete não queira cumprir. Mas muitas vezes não é capaz/ não sabe como o fazer. Quando isso acontece, o outro membro do casal sente-se progressivamente desiludido, desgastado e, claro, desligado. Confronto-me demasiadas vezes com os frutos deste padrão: uma pessoa com genuína vontade de mudar, de se comprometer (ainda que não saiba como o fazer) e outra demasiado cansada de tantas promessas feitas em vão (muitas vezes com os dois pés fora da relação).
Não significa que quem promete não queira cumprir. Mas muitas vezes não é capaz/ não sabe como o fazer. Quando isso acontece, o outro membro do casal sente-se progressivamente desiludido, desgastado e, claro, desligado. Confronto-me demasiadas vezes com os frutos deste padrão: uma pessoa com genuína vontade de mudar, de se comprometer (ainda que não saiba como o fazer) e outra demasiado cansada de tantas promessas feitas em vão (muitas vezes com os dois pés fora da relação).
AMUOS. Quando nos sentimos profundamente magoados com o
comportamento da pessoa que amamos, temos à nossa disposição vários caminhos
possíveis – uns mais inteligentes do que os outros. Podemos expor o nosso
desagrado de forma assertiva, ignorar o erro e acumular tensão, assumir uma
postura agressiva ou amuar. Os amuos são uma resposta automática que algumas
pessoas assumem, fechando-se sobre a sua concha. Nesses momentos a pessoa está
convencida de que tem “direito” àquele recolhimento. Na prática está a ignorar
o desprezo exercido sobre o cônjuge. Desprezo, sim! Um amuo é uma forma de desprezo. É um castigo que uma pessoa exerce
sobre a outra. Eu chamo-lhe veneno para qualquer casamento, tal é o seu poder
destrutivo.
DECISÕES UNILATERAIS. Ao longo da nossa vida somos confrontados com
algumas decisões significativas – aceitar ou não determinado emprego, ter ou
não ter filhos (e em que altura), voltar a estudar ou não, etc. As necessidades
individuais devem ser, obviamente, consideradas. Ninguém deve anular-se
enquanto indivíduo a partir do momento em que assuma um compromisso conjugal.
Mas tão pouco fará sentido que qualquer uma destas decisões sejam tomadas de
forma unilateral. A menos, claro, que a relação não seja assim tão
significativa. Uma pessoa pode tomar uma decisão sozinha e alegar que teve em
consideração as necessidades do seu cônjuge mas se, na prática, o processo for
gerido individualmente e o cônjuge se sentir posto de parte, o compromisso
acaba por sair abalado. Um casamento
feliz e duradouro implica a construção de um verdadeiro “nós”, onde a
comunicação seja fluída e ambos se sintam realmente ouvidos e apreciados.