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4.11.13

TRAIÇÃO E FIM DO RELACIONAMENTO


Há dias fui entrevistada para um jornal brasileiro a propósito de uma reportagem sobre pessoas que foram traídas e terminaram a relação. Partilho as minhas respostas:

Depois de uma traição, os hábitos da pessoa devem mudar? Por exemplo, deve parar de frequentar os lugares onde ia com o ex, evitar ver filmes que falem de romantismo, evitar o encontro com amigos em comum...

O fim de uma relação equivale quase sempre a alguma forma de renovação. Isso faz parte do processo de luto e da adaptação a uma nova realidade. Mais: abre espaço à mudança para melhor. Claro que, imediatamente após o fim da relação, é pouco provável que a pessoa esteja suficientemente estruturada ao ponto de saber exatamente o que quer para si a médio e longo prazo. Depois de uma traição o mais frequente é que a pessoa se sinta demasiado confusa. Há até quem se sinta traumatizado. Isso significa que a pessoa pode dar sinais de muita tristeza e até mostrar vontade de se recolher, de estar na sua concha. Faz parte de uma das fases do luto, a fase mais depressiva. Nem todas as pessoas passam por isso mas é importante reconhecer que, se esses sinais existirem, eles são normais e transitórios.

Outras pessoas “saltam” de imediato para uma fase mais adaptativa, marcada pela mudança de hábitos. O que acontece é que há uma tentativa de arregaçar as mangas e olhar em frente. A pessoa pode efetivamente querer sair com pessoas novas, conhecer lugares novos, evitando assim confrontar-se com as pessoas e rotinas que antes associava ao seu relacionamento. Esta estratégia é funcional para uns mas pode ser desastrosa para outros. Nem todas as pessoas são capazes de se afastar da sua rede de suporte numa fase tão desestabilizadora como esta. E os amigos, mesmo aqueles que também forem amigos do ex, podem ser muito importantes no sentido de permitirem que a pessoa se sinta amparada, compreendida e valorizada.

Dizem que viajar é um excelente remédio. É isso mesmo ou será que, na volta para casa e para a rotina, a dor pode aumentar?

Mais uma vez, importa salientar que aquilo que funciona para uma pessoa pode não funcionar para outra. O mais importante é que cada um esteja atento àquilo que sente e seja capaz de ir ao encontro das próprias necessidades. Se a pessoa se sente assoberbada por recordações de momentos de tensão e está, sobretudo, a precisar de alguma paz e sossego, uma viagem pode ser o primeiro passo para a restruturação. Mas se essa alternativa for apenas uma fuga aos problemas, uma tentativa de apagar a própria dor, então a viagem pode revelar-se ruinosa. Podemos sair da cidade ou do país. Mas as nossas emoções viajam connosco. Com uma agravante: se o fizermos sozinhos, temos de nos confrontar com sentimentos como a tristeza e a solidão longe da nossa rede de suporte.

Como é que essa pessoa pode se conformar e seguir em frente sem que a dor a acompanhe?

A dor faz parte do fim de um relacionamento, sobretudo depois de uma traição. Ignorar essa dor ou desejar que ela se evapore é fantasioso. Mas sentir essa dor não tem de ser dramático. Cada pessoa gere os seus sentimentos de forma diferente mas há duas ou três dicas que são universais. A primeira tem a ver com o isolamento social. É muito mais fácil seguir em frente na medida em que nos sintamos amparados, pelo que os amigos e familiares são recursos fundamentais. Se a pessoa estiver ferida é pouco provável que se anime ao ponto de ter vontade de sair com os amigos mas é preciso fazer escolhas emocionalmente inteligentes. E ficar o tempo todo em casa (ou no trabalho) não é uma escolha que proteja a saúde emocional de ninguém. Quanto mais vezes a pessoa for capaz de contrariar o isolamento e aceitar o desafio de se distrair, mais rapidamente se sentirá capaz de se entusiasmar com novos projetos, com novos rumos.

Aceitar a dor também implica falar sobre ela. Algumas pessoas acham que, para seguir em frente, precisam enterrar as mágoas, deixar de falar no ex. Não é bem assim. Muitas vezes a pessoa precisa de desabafar, de falar sobre o que aconteceu, mesmo que isso implique voltar a chorar. Mais cedo ou mais tarde, o assunto esgota-se e a pessoa percebe que já não tem tanta necessidade de falar sobre a relação anterior.

Em quanto tempo, em média, é possível superar a traição?

Depende de muita coisa. Da personalidade de cada pessoa, da duração da relação, do investimento que a pessoa acha que fez no relacionamento, da forma como a traição foi descoberta e até do tipo de infidelidade. Há diferenças consideráveis entre um encontro de uma noite e uma traição continuada. Mas, mais importante do que isso, cada pessoa tem o direito de sentir os acontecimentos de forma diferente. Algumas pessoas são mais resilientes do que outras, mais capazes de dar a volta aos obstáculos.

Um novo amor é sempre o melhor remédio?

Não creio que o amor mereça ser encarado como um remédio. Do meu ponto de vista só faz sentido que a pessoa parta para uma nova relação se se sentir pronta para isso. Um novo relacionamento não tem poderes curativos e, se a pessoa traída ainda estiver conectada ao passado, o mais provável é que surjam problemas. Para que um amor seja vivido em pleno é preciso que as duas pessoas estejam livres. Livres de qualquer ex mas também de mágoas ou traumas que as condicionem na nova relação.

Para mim, um novo amor pode ser, sobretudo, um sinal de que a pessoa já completou o processo de luto e está pronta para traçar um novo rumo.

De que forma a psicoterapia pode ajudar alguém que sofreu tamanha deceção?


A psicoterapia é útil sempre que a pessoa se sente bloqueada, isto é, quando, sozinha, não é capaz de vislumbrar uma forma de dar a volta à tristeza. Nestes casos é relativamente frequente que a pessoa se sinta sem esperança, num poço sem fundo, enredada num amontoado de pensamentos negativos. E é frequente que a autoestima diminua drasticamente. A psicoterapia pode dar resposta a tudo isto - devolvendo a esperança de forma sustentada, ajudando a gerir as emoções de forma equilibrada, identificando os pensamentos irracionais e substituindo-os por outros que deem lugar a um otimismo realista.

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