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7.1.14

COMO CRIAR UM BOM AMBIENTE FAMILIAR


“Eu nem sei dizer como é que isto aconteceu… Quando dei por mim, já estávamos a discutir outra vez”.

Não faço ideia de quantas vezes já ouvi comentários como este no meu consultório. A pessoa mostra-se claramente desorientada. É genuína a vontade de reconstruir um clima de harmonia na relação mas também é evidente a incapacidade de controlar o rumo de cada conversa. É como se cada troca de palavras ganhasse vida própria e, quer se esteja a conversar sobre leite condensado, papel de parede ou aquecimento global, o desfecho fosse sempre o mesmo: elevação do tom de voz, críticas, insultos e uma pilha de nervos interminável. E depois leva cada vez mais tempo até que os membros do casal voltem a dizer o que quer que seja. Até pode haver vontade de acarinhar, de partilhar alguma coisa, mas há mágoas que se vão acumulando, há ruminações à volta das acusações que o outro fez no calor da discussão. E há medo, claro. O medo de que a conversa descambe – como que por magia – numa nova discussão. E ninguém está para isso.

Como é que se contraria um ciclo vicioso como este? Se a resposta fosse simples e curta viria impressa em pacotinhos de açúcar, para que nos lembrássemos dela com frequência :). Se se identifica com este padrão relacional, não desespere. É possível reverte-lo (ainda que possa demorar um pouco mais do que você e a sua família gostariam). Aqui estão algumas dicas:

Pare para pensar. Você já deve ter gasto algum tempo a refletir a respeito deste “problema de comunicação”. Talvez tenha investido mesmo muito tempo a tentar identificar o que está errado. Talvez tenha acordado várias vezes com a motivação em alta, pensando “Hoje não vou discutir com o meu mais-que-tudo”. Mas depois dá por si enredado em mais um momento de tensão. Já parou para pensar naquilo que mais o tem perturbado nos últimos tempos? Quais são as suas preocupações? Aquilo que o deixa ansioso? E o que é que tem feito para lidar com essas dificuldades? Por outro lado, acha que conhece verdadeiramente as preocupações do seu cônjuge? Tem a certeza de que ele/a se sente à vontade para partilhar consigo aquilo que o angustia? Eu não conheço a sua relação mas a experiência mostra-me que, nalguns casos, a frequência dos conflitos é apenas a face visível de um problema. E que a irritabilidade pode ser um sinal de tristeza. Às vezes descarregamos precisamente nas pessoas de quem mais gostamos, sem que tenhamos consciência do que estamos a fazer.

Pare para acarinhar. O conflito faz parte de uma relação amorosa. Mas não é suposto que um casal passe mais tempo a discutir do que a namorar. Por falar nisso, há quanto tempo é que você não namora com o seu cônjuge? Dar um beijinho de fugida quando chega do trabalho não conta. Falo em namorar mesmo. Dar mimo. Dar colo. Prestar atenção. Andar de mão dada, beijar por mais de 5 segundos, fazer festinhas… A precariedade nos gestos de afeto é responsável pela sensação de desapego. As pessoas que deixam de dar (e receber) gestos de afeto tendem a sentir-se mais irritáveis e, claro, discutem muito mais. A páginas tantas já nem sabem muito bem o que as move ou por que é que estão juntas.

Pare para elogiar. Você não tem noção mas é provável que você critique o seu mais-que-tudo todos os dias. Não acredita? Pergunte-lhe. Pergunte se ele(a) se sente criticado(a). Atacado(a). Injustiçado(a). Você pode não fazer por mal mas a verdade é que se, de cada vez que abre a boca, sai uma chamada de atenção – “Ainda não foste despejar o lixo?”, “Outra vez atrasado? É sempre a mesma coisa.”, “Tens a camisola suja”, “Estás muito gorda”, “Estás muito magra”, “Tens a barba por fazer”, “Já ligaste à tua mãe ou preciso de te lembrar outra vez” – ufaaaaaa! Quando é que sai um elogio? Sabia que o seu parceiro precisa deles como de água para viver? Sabia que o seu desleixo nesta matéria abre espaço para o desinteresse, para o conflito e para o aparecimento de terceiras pessoas? Pense nisso. Valorize a pessoa que está ao seu lado. Mostre-lhe de forma clara a sua admiração. É possível que se surpreenda.


Pare para conversar. Às vezes as coisas são aquilo que parecem. O aumento da frequência das discussões pode ser um sinal de que a relação já teve dias melhores e uma conversa a dois pode não ser suficiente para dar volta às dificuldades. Mas pode ser o primeiro passo para que um e o outro exponham aquilo que lhes vai na alma e assumam compromissos. Ou para que se assuma que é preciso pedir ajuda, que é preciso conversar com alguém de fora para evitar que o ressentimento cresça e a relação acabe.

Terapia Familiar e de Casal em Lisboa