São elas. São maioritariamente elas que caem neste padrão de relacionamento. Chamo-lhe um AMOR-PRISÃO mas poderia chamar-lhe relação abusiva. Por que é de violência emocional que se trata, mesmo que elas (às vezes eles) levem muito tempo para o reconhecer. Tempo suficiente para que haja danos que tantas vezes se prolongam por anos. Mas do que falo quando me refiro a este AMOR-PRISÃO?
Falo de uma relação que, gradualmente,
toma conta de toda a vida da pessoa. Não, não estou a referir-me à aceleração e
ao fogo característicos da paixão. Não estou a falar daquilo que acontece
quando nos encantamos por alguém. Da circunstância de só falarmos daquela
pessoa, de quão fantástica ela é ou de como nos faz sentir únicos, especiais. Isso é normal. Isso é saudável. Falo do
afastamento que o AMOR-PRISÃO impõe – a pessoa começa por passar cada vez menos
tempo com os amigos porque ele/a não gosta e nem se questiona sobre o impacto
desse distanciamento. Vai perdendo momentos importantes das vidas daqueles que
até há bem pouco tempo eram fontes de afeto, de suporte e de bem-estar. Vai
deixando de fazer parte das rotinas. Vai-se
isolando. E chega o dia em que também é necessário afastar-se da família.
Porque ele/a não gosta. Porque implica. E a pessoa cede. Para evitar confusões.
Para evitar discussões.
Sem se aperceber, a pessoa que vive um
AMOR-PRISÃO vai fazendo concessões em nome de uma paz podre. Quer evitar
discussões. E, ainda assim, elas – as discussões – teimam em parecer. Parece
que nada do que a pessoa faça é bem feito aos olhos da pessoa amada. E, num
ciclo vicioso, a autoestima decresce e a única coisa que passa a interessar é a
opinião daquele AMOR-PRISÃO. A pessoa vive centrada em agradar. Em não
desagradar. Porque se a pessoa amada se enervar…
Não quer dizer que haja violência
física. Muitas vezes não há, o que dificulta a perceção de quem vive um
AMOR-PRISÃO.
“Ele/a
não é violento/a! Afinal, nunca me bateu!”
Mas a violência está lá. Está presente
quando a pessoa deixa de se sentir livre para emitir a sua opinião. Está
presente nas discussões intermináveis, quase sempre marcadas por exercícios de manipulação. Mas também por insultos e humilhações. A violência
está lá quando, em nome deste AMOR-PRISÃO, a pessoa que ambicionava sentir-se
completa, plena, passa a sentir-se só. Quando gasta toda a sua energia para
agradar ao monstro. Claro que, enquanto o AMOR-PRISÃO durar, o monstro
continuará a ser visto como um príncipe. Um príncipe com problemas. Um príncipe
cujas vulnerabilidades o impedem de fazer as escolhas certas. E a pessoa vive
convencida de que os seus esforços serão recompensados. Acredita que o pode salvar. Que o pode libertar das mágoas do
passado. Ajudá-lo a ser feliz. E investe tudo nessa missão. Sem perceber que
está apenas a abdicar da sua própria felicidade.
A pessoa passa muito tempo, às vezes
todo o tempo, a esforçar-se para que o relacionamento resulte e não se apercebe
de que não está a usufruir de qualquer bem-estar. Não está a aproveitar a
relação, mesmo que esteja a dar tudo para que ela se mantenha.
E até pode chegar o momento em que a
pessoa percebe que não está bem. O momento em que se queixa. Mas as queixas
caem em saco-roto porque do outro lado não está alguém maduro, responsável, com
vontade de lutar pela relação. Do outro lado está quase sempre alguém
autocentrado, incapaz de atentar a outras necessidades que não sejam as suas.
Está alguém que pressiona, manipula, agride.
Que amor é este? É de loucos, dizem
elas (às vezes eles). É brutal. É
intenso. Mesmo que a intensidade da paixão só seja reconhecível nos
primeiros tempos. Depois a intensidade só é visível na força das acusações, na
violência das discussões, na brutalidade das ameaças. Até onde podem ir as
ameaças? - “Olha que me mato! Não vês como és importante para mim? Por que não
fazes o que te peço?”.
No AMOR-PRISÃO não há tranquilidade.
Não há admiração. Não há respeito. Há um refém. Que pode dizer BASTA e escolher
ser feliz.