Há quem diga que alguns médicos são
frios. Lidam com situações clínicas graves sem mostrar um pingo de emoção. Não
é que sejam brutos ou agressivos. São “secos”. Não se ligam, não mostram – pelo
menos de forma clara – qualquer preocupação ou compaixão. Mas o que seria de um
médico que tomasse para si as dores de todos
os seus pacientes? O que seria de um oncologista, por exemplo, se se conectasse
a todas as pessoas a quem tenha de dar más notícias? Será que resistiria a um
só dia de trabalho? O mais provável é que não aguentasse e sucumbisse a tanta
emoção negativa.
Há
um limite de dor e tristeza para cada um de nós
e, por mais voltas que se dê ao assunto, é fundamental que cada pessoa se
conheça a si mesma ao ponto de ser capaz de se defender. Porque quando a
própria pessoa desconhece os seus limites e assume uma postura de entrega total
arrisca-se a sucumbir às dores dos outros, a sentir-se esgotada e incapaz de
ajudar quem quer que seja – incluindo a si mesma.
São muitas as vezes em que me deparo
com quem quer continuar a ajudar um membro da família, um namorado ou um amigo
e não consegue reconhecer que não está capaz. Ou que já não está capaz. A pessoa convence-se de que tem a obrigação
de ajudar. Acredita que é esse o seu papel – enquanto pai, filho ou melhor
amigo – e ignora aquilo que para mim é óbvio: só se pode ajudar se se tiver
condições para tal. Se o problema da outra pessoa for de tal modo esgotante que
permita que quem ajuda se sinta a afundar, o mais provável é que, em vez de
uma, mais cedo ou mais tarde haja duas pessoas a precisar de ajuda.
Não há nada de egoísta em dizer não
nestas circunstâncias. “Não consigo”. “Não estou capaz”. Não é “Não quero”.
Ignorar as suas próprias necessidades, as suas próprias emoções, os seus
limites não é uma escolha inteligente nem protetora das suas relações afetivas.
Entregar-se aos problemas das pessoas de quem gosta ao ponto de fazer mal a si
mesmo não dignifica ninguém.