Ao meu consultório chegam todos os dias
pessoas que, por um motivo ou por outro, perderam pelo menos uma parte da fé na
sua relação. Cada história de vida é única mas há problemas que se repetem. Há
queixas que se repetem. De tal forma que, como expliquei antes, é possível identificar as queixas mais comuns. Esta é a segunda parte da lista:
“ELE(A) NÃO FALA COMIGO”
O que é que acontece quando alguém tem
a perceção de que está a dar tudo o que tem e, como recompensa, só leva “pancada”?
O que é que acontece quando é precisamente a pessoa em quem apostámos todas as
fichas que – de forma aparentemente descontraída – despreza os nossos apelos? Fechamo-nos. Desistimos. Calamo-nos. É
verdade que o amuo não é propriamente um sinal de inteligência emocional. Mas
não sendo um caminho frutífero, é o produto da sensação de insegurança, do
desamparo, da acumulação de experiências negativas. O problema é que aos olhos
do mais-que-tudo os comportamentos que mostram desprezo podem não ser assim tão
claros. É muito frequente deparar-me com remorsos e sentimentos de culpa de
quem não fazia ideia de que estava a falhar. O pedido de ajuda é muitas vezes o
primeiro e importante passo para que quem “não fala” possa finalmente expor
aquilo que sente e o casal volte a conectar-se.
“EU
QUERO TER MAIS UM FILHO MAS ELE(A) NÃO”
Aparentemente este é um impasse
impossível de gerir. Não há negociação possível, certo? E um não pode (ou pelo menos não deve) obrigar o outro a ceder numa
matéria como esta. Mas é preciso olhar para o problema de outro ângulo. É
preciso conhecer o percurso daquele casal – os sonhos com que partiram para
esta relação, aquilo que foram capazes de construir e, sobretudo, os laços que
existem. A experiência mostra-me que quase todas as queixas estão relacionadas
com a fragilidade dos laços afetivos. E se não houver uma relação coesa,
marcada pela vontade genuína de fazer a pessoa que está ao nosso lado feliz e
pela segurança de que essa pessoa também faz tudo em nome da nossa própria
felicidade, instala-se o medo, a
incerteza, a insegurança. Daí às cobranças, aos ultimatos, aos
braços-de-ferro, pode ser só um pequeno passo. Porque há um que se sente
inseguro e que, em função dessa insegurança, assume comportamentos mais ou
menos desesperados e, de forma involuntária, afasta ainda mais o outro.
Quando se olha para trás e, sobretudo,
quando ambos aprendem a comunicar de forma clara as suas necessidades afetivas,
tudo se torna mais fácil. E os sonhos a dois voltam a fazer sentido.
“PARECEMOS DOIS IRMÃOS”
Ou dois amiguinhos. Esta queixa é muito
mais frequentemente verbalizada pelos homens e está quase sempre associada à
diminuição da satisfação sexual. Muitas vezes estamos perante pessoas que
deixaram de ter relações sexuais. São casais novos, que não compreendem como é
que chegaram até aqui. São quase sempre casais com filhos em idade escolar que
permitiram que o tempo passasse sem que a relação continuasse a ser devidamente
alimentada. E mesmo quando param para conversar sobre o problema e decidem que
é tempo de voltar a namorar, esbarram numa multiplicidade de barreiras. Parece que nada funciona, parecem dois
estranhos na cama. Não há chama, não há romance. Mas gostam um do outro! De
um modo geral, esta é uma questão que gera aflição e que em muitos casos está
na origem de conversas sobre o divórcio. Mas quando o pedido de ajuda é feito e
os membros do casal têm oportunidade de olhar para a sua relação como um todo,
percebem que a insatisfação sexual não é mais do que uma manifestação da
fragilidade da sua ligação. Como não são robôs e a sexualidade está integrada
na intimidade emocional, é preciso voltar a fortalecer outros laços para que
ambos voltem a sentir-se seguros e apaixonados. Às vezes parece muito difícil e
complicado mas é sobretudo uma questão de foco e perseverança.
“ELE(A) NÃO SAI DO FACEBOOK.”
Algumas pessoas optam facilmente por
fugir às dificuldades voltando-se para fora, encontrando escapes que lhes
permitam ignorar os problemas. Alguns saem de casa em direção ao café assim que
a mulher (ou o marido) começa a resmungar, outros refugiam-se no trabalho ou vão
às compras. E depois há aqueles que descobrem as maravilhas da gratificação
imediata associada ao Facebook. A falta de vontade de encarar as dificuldades
ou até a sensação de incapacidade de as resolver podem levar o comum dos
mortais a escolher ignorar os apelos do cônjuge. Como o Facebook pode funcionar como uma boa massagem ao ego – um simples
“Gosto” pode ser o suficiente para mascarar o estado emocional de uma pessoa -,
percebe-se facilmente por que há tanta a gente a alienar-se do próprio
casamento. Às vezes de forma gradual, às vezes de forma abrupta, o
deslumbramento passa a ocupar demasiado tempo e espaço e sobra pouca disponibilidade para enfrentar as queixas da pessoa amada.
Como nenhuma relação vive do ar, é só uma questão de tempo até que as queixas
se transformem em ultimatos ou, pior, em anúncios de divórcio.
Nem todos os casais que apresentem
queixas relacionadas com o tempo de utilização do Facebook estão à beira da
rutura. Aquilo que quero dizer é que qualquer queixa é um apelo, é uma chamada
de atenção. E quando nada muda, tudo pode mudar de repente.