«Eu adoro a minha vida, adoro o
meu marido e não quero que nada mude.». Esta foi a frase que Carolina repetiu
até à exaustão sempre que alguém lhe perguntava por que é que ainda não tinha
filhos. Embora nunca tivesse colocado de lado a hipótese de engravidar, o medo
de que a chegada de um bebé pudesse virar tudo do avesso fê-la adiar esse passo
durante anos. Quando me pediu ajuda, continuava feliz ao lado de Francisco mas
o casal tinha finalmente decidido ter filhos. Ao contrário do que costuma
acontecer, o pedido de ajuda não surgiu em resposta a qualquer crise na
relação. Era, isso sim, uma atitude preventiva. Carolina e Francisco queriam
apetrechar-se de ferramentas que os protegessem da chegada de um bebé. Embora
não estivessem pessimistas em relação ao futuro que escolheram, também não estavam
dispostos a correr o risco de a sua relação ruir depois do nascimento do
primeiro filho. «Toda a gente nos diz
que, depois do nascimento de um bebé, muda TUDO. A maior parte das pessoas que
conheço faz questão de abrir bem os olhos na altura em que pronuncia esta
palavra: TUDO. Não me considero uma pessoa catastrofista e reconheço que há
muitos casos de sucesso mas estaria a mentir se dissesse que me sinto segura.
Temos dois casais amigos com filhos pequenos que acabaram de se separar, um dos
meus primos está à beira do divórcio e toda a gente diz que, com crianças, o
tempo a dois praticamente desaparece.».
Toda a gente sabe que os bebés
dão trabalho. Aquela que é muitas vezes vista como a fase mais bonita da vida
de um casal é, também, a altura em que o sono escasseia, as tarefas
multiplicam-se e ambos vivem com a sensação de que o tempo voa. Para culminar,
de um modo geral, as conversas e os momentos a dois são substituídos por turnos
em que cada um está a alimentar/ adormecer/ limpar/ entreter o bebé. Mas será
que há motivos para alarme?
As estatísticas dizem que sim. 67
por cento dos casais com filhos pequenos (até aos três anos) mostram-se
insatisfeitos com a relação. Só 33 por cento dos casais se mantêm felizes
depois do nascimento das crianças.
A minha experiência clínica, tal
como a investigação nesta área, mostra-me que a maior parte das dificuldades
por que os casais com filhos pequenos passam está relacionada com a
deterioração da comunicação. Todos os casais discutem – com ou sem filhos - mas
quando não há filhos há mais tempo para recuperar, para fazer as pazes, para
falar sobre o que correu mal. E, sobretudo, há tempo para fazer coisas
divertidas a dois entre discussões e, assim, manter um saldo positivo na
relação. No primeiro ano de vida de um
bebé os membros do casal dormem quase sempre muito pior, acumulam um conjunto
de tarefas novas e tentam sobreviver nos respetivos empregos fora de casa.
A vida muda, quase sempre para melhor, mas há mais exigências e menor
disponibilidade para os afetos. Em muitos casos, a mulher vê o desejo sexual
diminuir de forma drástica – fruto do cansaço, das alterações hormonais e da
dedicação ao papel parental – e o marido sente-se abandonado. Como não há muito
tempo para o romance e as noites mal dormidas trazem consigo mais
irritabilidade, é possível que ambos digam muitas coisas sem sentido, que ambos
se sintam magoados e que haja algum afastamento.
O que é que distingue os casais
que sobrevivem com sucesso a todas estas dificuldades? O que é que caracteriza
aqueles 33 por cento da população para quem a chegada de um bebé parece não
produzir grandes danos à relação?
Desenganem-se aqueles que acham
que o segredo é ter dinheiro para contratar dez empregados. Se fosse assim, as
celebridades não se divorciariam, certo?
A verdade é que há psicólogos que
se dedicam a acompanhar a vida de casais desde o noivado até à chegada dos
filhos e as investigações nesse âmbito têm permitido tirar conclusões
importantes. Hoje sabemos que os casais que resistem ao nascimento dos filhos
(com felicidade) são aqueles que continuam a dedicar tempo à relação conjugal.
Isso significa que fazem aquilo que está ao seu alcance para continuar a criar
aquilo a que chamo de momentos de conexão. Na prática:
- Esforçam-se diariamente para que haja conversas a dois que lhes permitam manter-se a par do que acontece no dia-a-dia de cada um (às vezes são só 15 minutos);
- Procuram “dar colo” quando o outro se queixa (em vez de revirar os olhos e dizer “Não tenho tempo para isto”);
- Continuam a conversar sobre tópicos “extra-bebé” (ainda que 99 por cento das conversas girem à volta deste assunto);
- Esforçam-se por alimentar a relação através de gestos de afeto (um beijo de 5 segundos faz milagres por qualquer relação e só “rouba”… 5 segundos);
- Aproveitam todas as oportunidades para estar sozinhos e namorar (ir ao supermercado enquanto os avós ficam com o bebé pode não ser tão romântico como um jantar à luz de velas mas saber-lhes-á pela vida se decidirem acarinhar a relação em vez de prolongar a última discussão com amuos);
- Reconhecem que ambos precisam de tempo para si (uma hora para ir ao ginásio, ao café ou para ficar trancado no quarto sem fazer nada saberá a céu na terra se o parceiro ficar a tomar conta do bebé sem interrupções).
Nem todas as relações sobrevivem
ao nascimento de um bebé. A de Carolina sobreviveu à chegada de dois.