«Qualquer um pode zangar-se -
isso é fácil. Mas zangar-se com a pessoa certa, na medida certa, na hora certa,
pelo motivo certo e da maneira certa não é fácil.». Sei de cor a frase de
Aristóteles. Repito-a muitas vezes no consultório – quase sempre para explicar
que os conflitos são importantes, sim, mas que há uma fronteira que separa uma
discussão saudável de uma discussão perigosa. É verdade que toda a gente erra.
É verdade que ninguém está imune à possibilidade de magoar a pessoa amada. Em
momentos de aflição não é fácil manter a cabeça fria e agir de forma ponderada.
De resto, quanto maior for a sensação de desamparo, maior é probabilidade de
alguém dizer coisas sem pensar e, em função disso, agravar a situação. Mas é
fundamental que cada um dê o seu melhor no sentido de evitar mágoas que possam
causar (ainda mais) desconexão.
Estas são algumas das frases que
não deve dizer à pessoa de quem gosta:
#1: «NÃO ME CHATEIES»
Ninguém gosta de discutir.
Ninguém. Às vezes pode parecer que a pessoa que está ao seu lado só está bem a
discutir. Pode dar-lhe a sensação de que tudo é motivo para que ela se enerve
e/ou implique consigo. E isso pode levá-lo(a) a dizer coisas como «Deixa-me em
paz», «Não me chateies», «Só estás bem a discutir» ou «Que chato(a)!».
E é claramente um sinal de que algo não está
bem. Talvez não esteja a escolher a forma certa para se queixar. Talvez não
esteja a ser suficientemente tolerante consigo. Talvez esteja a assumir uma postura
excessivamente crítica. É justo que você se queixe. É justo que lhe explique
que se sente injustiçado(a). Mas a menos que se trate de alguém que esteja a
assumir uma postura de violência emocional sobre si, procure dar-lhe a
oportunidade de se queixar. Recusar-se a ouvir as queixas da pessoa de quem
gosta fá-la-á sentir-se desamparada, rejeitada.
#2: «TU NUNCA FAZES NADA BEM»
A utilização das palavras
«SEMPRE» e «NUNCA» numa frase em que esteja a mostrar o seu desagrado à pessoa
de quem gosta dificilmente será proveitosa. Quando alguém nos aponta uma falha,
é muito importante que sintamos que não é a nossa personalidade que está a ser
atacada e isso é mais fácil quando a pessoa se refere a UMA SITUAÇÃO
ESPECÍFICA. Se disser «Não gostei que tivesses feito “X” porque me senti “Y”»
ou «Quando fizeste “X”, eu senti-me “Y”. Era muito importante para mim que
fizesses “Z”», estará a fazer um apelo de forma a potenciar a recetividade da
outra pessoa. Estará a reclamar – porventura num tom zangado – sem atacar, sem
desrespeitar, sem desprezar. Nem sempre é fácil esperar o melhor da outra
pessoa mas é muito importante recordar que o desprezo e a hipercrítica são
autênticos venenos para qualquer relação.
#3: «ÉS UM(A) MARIQUINHAS»
Para dizer a verdade, os rótulos
quase nunca são uma boa ideia. Definir a personalidade de outra pessoa já é uma
forma de desrespeito. Fazê-lo em tom de gozo, de desqualificação e/ou de
desconsideração pela forma como se sente é meio caminho para que a outra pessoa
se sinta profundamente desamparada. Quando estamos em sofrimento - seja porque
perdemos um animal de estimação ou porque se avizinha uma mudança profissional
que nos assusta – esperamos que a pessoa que está ao nosso lado preste atenção,
dê importância e nos apoie. Isso não significa que deva concordar com a forma
como pensamos. Duas pessoas podem olhar para a realidade de formas diferentes,
podem sentir-se de modos muito distintos na mesmíssima situação e, ainda assim,
apoiar-se mutuamente.
Isso é muito mais difícil quando
damos por nós a pensar que, no seu lugar, sentir-nos-íamos de forma diferente e
geriríamos tudo de outra maneira. Há muitas alturas em que a pessoa que está ao
nosso lado não precisa de sermões nem de empurrões, mas sim de colo.
#4: «JÁ OLHASTE BEM PARA TI?»
«Estás uma baleia» ou «Pareces
uma anorética» podem parecer-lhe boas ideias no que diga respeito à
possibilidade de manter uma postura franca na relação mais íntima de todas. Não
são. Ser frontal a qualquer preço está muito longe da assertividade que defendo
em qualquer relacionamento. Dizer que (já) não gosta do aspeto físico da pessoa
que está ao seu lado pode ser duro mas é justo. Dizer-lhe que o seu desejo
diminuiu ou que já não se sente tão atraído pode gerar sofrimento mas abre
espaço para mudanças que podem salvar a relação. Atacar, assumir uma postura
agressiva sob a capa da frontalidade é inadequado, desrespeitoso e gerador de
sofrimento inútil. A pessoa que oiça este tipo de comentários sentir-se-á
provavelmente culpada, atacada e sem forças para implementar mudanças
importantes.
#5: «AS DESCULPAS NÃO SE PEDEM. EVITAM-SE»
Perdi a conta ao número de vezes
que ouvi esta frase em contexto clínico. Quem o diz fá-lo quase sempre convicto
de que está a dar uma grande lição à outra pessoa e ignora os danos que
provoca. Pedir desculpa não só não é coisa fácil como pode ser revelador de
humildade, inteligência emocional, vontade de dar importância à relação (mais
do que ao momento de tensão). Pedir desculpa nem sempre significa «Tens TODA a
razão». Pode significar «Tens razão. Magoei-te. E mesmo que também me tenhas
magoado, peço-te desculpa.». Dar esse passo deveria abrir espaço para que a
outra pessoa também assumisse a sua responsabilidade e/ou para uma
reaproximação. Um pedido de desculpas nem sempre é sincero, nem sempre traduz
genuíno arrependimento e muito menos pode ser visto como uma forma fácil de
passar uma borracha sobre os erros. Mas se uma pessoa tomar a iniciativa de
passar por cima do seu orgulho e pedir desculpa para tentar uma reaproximação e
levar um “chega p’ra lá” como este, é muito provável que se sinta rejeitada.
Se acabou de se dar conta de que
comete um ou mais destes erros, dê o seu melhor no sentido de o(s) emendar. Tentar
perceber como é que a pessoa de quem gosta se sentiu quando lhe disse
determinada frase é quase sempre uma boa forma de mudar para melhor.