«Esse vestido ficava-te melhor se tivesses menos 20 quilos.»
«Deves pensar que és alguma top model.»
«Só estás onde estás porque te envolveste com a pessoa X»
Basta abrir a caixa de comentários de um blog, a conta de Facebook ou de Instagram de qualquer mulher mais ou menos conhecida e damos imediatamente de caras com um rol de comentários que constituem formas de violência emocional. Não são críticas construtivas, não são opiniões divergentes da pessoa que fez determinada publicação. É bullying. É violência. Por que acontece? E porque é que estes comentários vêm quase sempre de outras mulheres?
Antes de mais, importa esclarecer o que é e o que não é violência: o abuso emocional pode ser caracterizado sobretudo pela intenção de inferiorizar, humilhar ou subjugar o alvo. Quando uma mulher diz a outra – olhos nos olhos ou através de um comentário na Internet - «Acho que esse vestido não te favorece.», está a criticar e pode, involuntariamente, gerar mágoa MAS isso não é violência. Uma crítica negativa é só isso: uma crítica. O abuso nem sempre é fácil de identificar, sobretudo porque algumas pessoas se esforçam por exercer a sua violência de forma subtil mas podemos SEMPRE dizer que há violência quando há uma tentativa CONTINUADA e INTENCIONAL de inferiorizar outra pessoa. É isso acontece quando alguém procura desvalorizar as vitórias de outra pessoa atribuindo-as ao facto de ser casada com a pessoa X ou, pior do que isso, dando a entender que o sucesso é fruto do envolvimento com pessoas fora da relação conjugal.
Por que é que estas formas de violência acontecem?
O que é que estas mulheres ganham em denegrir, rebaixar ou maldizer outras mulheres?
Do ponto de vista da Psicologia é relativamente fácil de explicar. Tal como acontece noutros cenários e noutras formas de violência emocional, as mulheres que praticam bullying em relação a outras mulheres são normalmente muito inseguras, têm baixa autoestima e pouco poder pessoal. Desengane-se quem considere que se tratam sempre de mulheres com perturbações de personalidade. De um modo geral, nestes casos aquilo que está doente é o sistema de valores. Há muitas mulheres com baixa autoestima que jamais ousariam insultar ou rebaixar outras pessoas. Mas quando existem falhas de caráter sérias, é mais provável que uma pessoa escolha exercer violência sobre outra. Há uma gratificação – pequenina e temporária – associada a cada abuso. De cada vez que uma mulher exerce poder sobre outra, subjugando-a, atacando-a, é como se camuflasse as suas próprias dificuldades e se sentisse melhor consigo mesma. É precisamente por se tratar de um efeito muito efémero e por, na prática, todas as dificuldades e fragilidades pessoais continuarem por resolver, que os abusos podem tornar-se “viciantes”. A pessoa que é emocionalmente violenta vai “precisar” de mais e mais exercícios de poder sobre outras pessoas para desviar a atenção da sua insegurança.
Todas as pessoas têm as suas lutas, as suas inseguranças. Mas todas têm também a possibilidade de prestar genuinamente atenção aos próprios sentimentos e necessidades. Quando paramos para reparar na nossa vida, é possível que nos demos conta de que nem tudo o que desejamos está imediatamente ao nosso alcance. Mas um olhar atento, curioso e gentil dar-nos-á quase de certeza a possibilidade de reparar em tudo pelo qual podemos ser gratos, em todas as pessoas a quem estamos ligados, em todas aquelas a quem podemos ligar-nos de formas mais afetuosas e em tudo o que está ao nosso alcance mudar.
Algumas mudanças dão efetivamente muito trabalho mas também acabam por ser precisamente aquelas que se revelam mais gratificantes. Investirmos na relação mais importante todas – aquela que temos connosco – ensina-nos a amar-nos e valorizar-nos na medida certa, independentemente de quaisquer comparações. Reconhecermos o poder – imenso – que temos sobre nós, sobre as nossas escolhas é muito mais recompensador do que qualquer exercício de poder sobre os outros.