Porque é que, quando tudo corre bem, temos medo que aconteça uma desgraça? O que é que nos impede de viver com alegria as fases da vida em que todas as peças se encaixam?
Numa conversa com o meu marido,
falava-lhe sobre o sentimento de gratidão por estarmos ambos envolvidos em
projetos que estão a trazer-nos muito prazer e entusiasmo. A resposta dele foi «Não
fales já que dá azar». Eu poderia dizer que esta é uma atitude tipicamente
portuguesa, mas a verdade é que o medo de ser feliz é algo universal.
Quantas vezes deu por si a olhar
à sua volta e a pensar «O trabalho está a correr bem, a minha família tem
saúde, os meus amigos são fantásticos, a minha relação está num momento tão
bom... Que desgraça estará para acontecer?», estragando automaticamente um
momento que poderia ser de felicidade e gratidão?
Boa parte deste processo está
relacionado com a neurofisiologia do nosso cérebro. Nós estamos
neurologicamente programados para reconhecer potenciais ameaças à nossa
sobrevivência e responder em conformidade. É esta capacidade que nos salva
quando prestamos atenção aos reais sinais de perigo e reagimos - lutando ou
fugindo. Mas…
Se há algo que as pessoas mais
otimistas têm em comum é o reconhecimento de que a realidade pode ser olhada de
múltiplas formas. A história que nós contamos a nós próprios a propósito de um
acontecimento que vivemos tem uma influência direta sobre a forma como nos
sentimos.
Quando
olhamos à nossa volta e nos sentimos
felizes com aquilo que temos, é possível
que
o nosso cérebro nos trapaceie inundando-nos
de pensamentos negativos. Se
prestarmos
atenção e identificarmos esses pensamentos
como PENSAMENTOS e não
como ameaças
reais, é mais provável que consigamos estender
o sentimento de
gratidão e que nos sintamos
genuinamente felizes, sem medo.
Uma das práticas que mais me tem
ajudado, quer pessoalmente, quer no meu trabalho clínico, é a meditação Mindfulness. Quando paramos
de propósito para meditar, estamos a dar ao nosso cérebro a possibilidade de se
exercitar, tal como fazemos com o nosso corpo.
Ouço muitas vezes frases como «Eu
não tenho jeito para meditar» ou «Eu não consigo meditar», que
traduzem sobretudo desconhecimento e algumas ideias feitas sobre esta
ferramenta terapêutica. A verdade é que a meditação mindfulness não tem nada de
esotérico ou religioso e também não requer propriamente esforço ou alguma capacidade
especial. Para meditar, basta que tiremos alguns minutos por dia (todos os
dias) e que observemos o momento presente.
Partilho aqui uma meditação
guiada, com a duração de 10 minutos, que pode fazer toda a diferença para quem
procura acalmar a mente e eliminar os pensamentos negativos:
Lembro que é a prática regular que traz frutos. Da mesma maneira que precisamos de ir ao ginásio com regularidade para desenvolver os nossos músculos, é crucial que nos disciplinemos para trabalhar o “músculo” do cérebro.
Por outro lado, quando nos
habituamos a fazer pausas com regularidade "apenas" para prestar
atenção às coisas pelas quais nos sentimos genuinamente gratos, sentimo-nos
invariavelmente mais felizes. Isto não tem nada a ver com "dourar a
pílula", escondermo-nos dos problemas ou resignarmo-nos a uma vida sem
ambição. Tem a ver, isso sim, com a possibilidade de nos permitirmos olhar para
a realidade de forma objetiva, com atenção plena às coisas e às pessoas que
valorizamos e com uma curiosidade gentil em relação aos sonhos que queremos
conquistar.