Como é que se reconstrói a confiança depois de uma traição? O que é que a pessoa que traiu pode fazer para ajudar a pessoa traída a voltar a confiar? E o que é que não deve (mesmo) ser feito?
A infidelidade continua a ser um
dos motivos pelos quais muitos casais recorrem à ajuda da terapia conjugal. Não
é por acaso: por um lado, este é um dos maiores terramotos por que uma relação
pode passar e, por outro, mesmo quando ainda há amor e vontade de reconstruir a
ligação, nem sempre é fácil identificar aquilo que cada um pode fazer.
Oiço muitas vezes as pessoas que
traíram referirem-se à sensação de impotência depois da infidelidade. Sentem
genuína vontade de ajudar o(a) companheiro(a), mas os seus esforços nem sempre
dão os frutos desejados. Hoje partilho algumas sugestões que podem ajudar a
restabelecer a confiança.
#1:
TEMPO
Há boas e más notícias referentes
à reconstrução da relação depois de uma traição. A boa notícia é que é possível
recuperar a confiança e (voltar a) ter uma relação geradora de satisfação,
alegria e cumplicidade. A má notícia é que isso dá trabalho e leva tempo.
É compreensível que duas pessoas
que se amam queiram ultrapassar uma crise rapidamente, mas, como em quase tudo
o que envolva perdas, é preciso tempo para que as emoções sejam geridas e o
luto seja feito.
#2:
FALAR
ABERTAMENTE
Há quem tenha vontade de “colocar
uma pedra sobre o assunto”, sobretudo com a intenção de evitar que o sofrimento
se prolongue, mas não é assim que a confiança é recuperada. De um modo
geral, para que voltemos a confiar e a sentir-nos seguros, precisamos da
certeza de que a pessoa que está ao nosso lado se importa com o nosso
sofrimento. Se ele(a) não quiser ouvir-nos, se não quiser responder a todas
as nossas dúvidas, o mais provável é que nos sintamos desamparados.
A pessoa que traiu pode tentar
assumir uma postura de genuína compaixão, procurando responder a todas as
perguntas com clareza e honestidade. Quanto mais abertamente conseguir falar
sobre o que aconteceu e sobre os próprios sentimentos, mais provavelmente a
relação poderá ser recuperada.
Nesse processo, é crucial que
se defina alguns limites. Uma coisa é responder com clareza e honestidade a
questões que permitam que o(a) companheiro(a) se sinta mais seguro(a) e outra,
bem diferente, é partilhar detalhes mais ou menos sórdidos que só acrescentam sofrimento
desnecessário. Um dos exercícios que costumo propor é que a pessoa que foi
traída possa elaborar uma lista de todas as dúvidas que (ainda) tem acerca do
que aconteceu para que possamos, em terapia, avaliar até que ponto é que
algumas destas questões devem ou não ser colocadas.
#3:
COMPROMISSO
COM A TRANSPARÊNCIA
Um dos passos que a pessoa que
traiu pode dar para o restabelecimento da confiança passa por fazer o que
estiver ao seu alcance para evitar equívocos que alimentem a insegurança do(a)
companheiro(a). Trata-se de telefonar sempre que disser que vai telefonar,
chegar a casa à hora a que disse que chegaria e responder às dúvidas que possam
existir.
Para a pessoa que foi traída,
quase tudo pode passar a ser um sinal de alarme e de intranquilidade, pelo que
é muito importante que haja um compromisso sério com a transparência.
Não se trata de nenhuma
condenação. A infidelidade não pode funcionar como uma justificação para
quaisquer tentativas de controlo, faltas de respeito ou comportamentos
abusivos.
Por outro lado, é fundamental que
a aflição e a vontade de manter a relação não permita que a pessoa que traiu
faça promessas que vão contra a sua própria dignidade ou que traduzam falta de
respeito por si mesma.
#4:
DAR ESPAÇO PARA
A EXTERIORIZAÇÃO DOS SENTIMENTOS
Raiva, medo, tristeza. De uma
maneira geral, a infidelidade é geradora de sentimentos intensos. Se esses
sentimentos não forem exteriorizados, a pessoa que foi traída acabará por
sentir-se sufocada, ansiosa e incapaz de voltar a confiar.
Oiço muitas vezes a queixa de que
a pessoa que traiu não quer voltar a ouvir falar sobre o assunto, mas a verdade
é que dizer «Isso é passado, vamos olhar para o futuro» é a última coisa de
que uma relação nestas circunstâncias precisa.
Por outro lado, é importante
aceitar que, neste processo, é natural que haja avanços e recuos. Em momentos
de desespero, a pessoa que foi traída terá vontade de mandar a outra embora (e
é possível que o faça). De um modo geral, tudo o que precisa é de um abraço e
de algumas palavras que lhe devolvam a segurança.
#5:
ASSUMIR A
RESPONSABILIDADE
Cada um é responsável pelos
próprios comportamentos. Mesmo que haja problemas no casamento anteriores à
infidelidade, a pessoa que traiu não deve culpar o(a) companheiro(a) pela sua
escolha.
É importante dar um passo de cada
vez. Quando somos capazes de assumir inteiramente a nossa responsabilidade, é
mais provável que, mais cedo ou mais tarde, haja disponibilidade para olhar
para trás e reconhecer aquilo que cada um (não) fez pela relação.
Algumas pessoas sentem-se
legitimamente sós e abandonadas na relação. Não andam à procura de uma terceira
pessoa, mas sentem-se carentes e negligenciadas. Até certo ponto, sentem-se
traídas. Esses sentimentos podem e dever reconhecidos, mas não devem servir de
justificação para a infidelidade.
A terapia de casal é, para
muitos, a oportunidade de falar abertamente sobre este turbilhão de sentimentos
de forma segura e estruturada.