É cada vez mais frequente
ouvirmos falar de divórcio e de novas formas de família. Olhamos à nossa volta
e damo-nos conta de que alguns dos nossos amigos já passaram pela experiência
de uma separação, reparamos que em qualquer turma uma parte significativa dos
alunos são filhos de pais separados e sabemos que as estatísticas são
demolidoras (em Portugal há, em média, 70 divórcios por cada 100 casamentos).
Estamos mais familiarizados do que nunca com o divórcio, mas isso está longe de
significar que este seja um acontecimento banal, sobretudo quando nos toca a nós.
Nascemos e crescemos programados
para construir laços afetivos. Sentimo-nos quase sempre mais felizes, mais
seguros e mais livres quando temos a oportunidade de desenvolver um sentimento
de pertença à nossa família. A maior parte do adultos que conheço ambicionam
viver um amor intenso, que dure “a vida toda” e, assim, oferecer aos filhos a
estabilidade e a alegria de uma família unida. Quase ninguém casa ou decide
viver a dois com a perspetiva de uma separação ou de um divórcio. Não é uma
questão de nos acharmos superiores aos outros, mas acabamos por viver como se
esta realidade jamais nos pudesse tocar.
Também por isso, para a
esmagadora maioria das pessoas, a decisão de avançar para o divórcio está
envolta num turbilhão de dúvidas e sentimentos. Quando um casamento se esgota,
é provável que haja sensação de fracasso, culpa, tristeza, raiva e medo. E, mesmo para a pessoa que toma a iniciativa de se separar e que sabe, do fundo do
coração, que já não é possível voltar a ser feliz na relação, as dúvidas são
muitas, sobretudo quando há filhos. E também neste caso há um luto que tem de
ser feito.
Eu passo a maior parte do meu
tempo enquanto psicóloga e terapeuta familiar a "salvar" casamentos,
pelo que sei bem quão arduamente a maioria das pessoas lutam para que a sua
relação dê certo e para que a sua família possa manter-se unida. Mas uma parte
do meu trabalho também passa por acompanhar pessoas num processo de separação.
É impossível não sentir compaixão pelo sofrimento que demonstram. Estão quase
sempre a viver o maior pesadelo das suas vidas e estão também quase sempre a
dar o seu melhor para evitar mágoas.
Visto de fora, é fácil apontar o
dedo. Quando olhamos para a notícia de que um casal está em processo de
divórcio, seja um casal amigo, uma pessoa da nossa família ou uma figura
pública, é fácil juntar as peças, atribuir responsabilidades e fazer juízos de
valor, como se estivéssemos a falar de um episódio de uma telenovela. Sem
querer, podemos até tomar o partido de um e deixar alguém que precisa de nós
numa posição ainda mais vulnerável.
Ninguém merece navegar sozinho ao
longo de um processo de divórcio. Ninguém merece ser julgado quando está a
viver um dos acontecimentos mais difíceis da própria vida.
O divórcio é um dos acontecimentos
mais stressantes por que o ser humano pode passar e ninguém está no seu melhor
nesta fase. Mas qualquer pessoa que esteja a passar por um divórcio sente-se
pressionada a fazer escolhas perfeitas. Afinal, a maioria das pessoas à sua
volta espera, por exemplo, que seja capaz de tomar as melhores decisões no que
diga respeito aos filhos.
Praticamente todos os pais e mães
com quem tenho trabalhado desejam o melhor para os seus filhos e esforçam-se
para fazer as escolhas que os protejam. Mas como é que se pode ter certezas
absolutas quando se está um caco? Como é que se pode fazer as escolhas
emocionalmente mais inteligentes quando a nossa vida está virada do avesso?
Como é que se mantém a calma e a objetividade quando uma parte das pessoas que costumavam
apoiar-nos nos viram as costas? Como é que se consegue prestar atenção plena às
necessidades dos filhos quando há tanta incerteza (e medo) em relação ao
futuro?
Quando decidi escrever o livro
"Continuar a ser família depois do divórcio", parti com a intenção
clara de ajudar quem está a passar por um divórcio com compaixão e amparo.
Procurei dar voz ao turbilhão de emoções por que se passa, tentei dizer de forma
clara "É normal e vai passar". Mas também dei o meu melhor para
partilhar o meu conhecimento e a minha experiência, no sentido de dar a conhecer as ferramentas
para que qualquer pessoa possa gerir as emoções com inteligência emocional e
aprender a lidar com todas as decisões que é preciso tomar - desde o momento em
que a separação é anunciada aos filhos e/ou à família alargada até ao momento em
que surge uma nova relação.