Em qualquer relação séria, há uma altura em que é preciso conversar sobre assuntos sérios. Qual é o momento certo para começar a falar sobre casamento? E como é que se inicia uma conversa como essa?
Hoje em dia a maior parte das
pessoas começam por viver juntas sem oficializar a relação. Para algumas, essa
é uma oportunidade de “testar” a relação, de crescer a dois e, assim, partir
com mais certezas para o casamento. Para outras, o casamento é uma ideia
longínqua para a qual ainda não se sentem preparadas. Algumas chegam a
verbalizar que gostariam de casar «um dia», mas emocionalmente há alguma
aversão a dar esse passo. Às vezes essa aversão está relacionada com o que
viram no casamento dos próprios pais ou com algumas ideias feitas que resultam
da observação de casais amigos. Na prática, a aversão ao casamento está muitas
vezes relacionada com o medo de repetir um padrão disfuncional e/ou com o medo que
a pessoa tem de se sentir sufocada. Esta sensação de sufoco é típica das
pessoas com estilo de vinculação amorosa evitante.
Para a maioria das pessoas com um
estilo de vinculação seguro ou ansioso, o desejo de casar acaba por surgir mais
cedo ou mais tarde. Para muitas dessas pessoas, o casamento é a base da criação
de uma família. Algumas têm a coragem de falar abertamente sobre isso, outras
não. O receio de trazer o assunto está quase sempre relacionado com o medo de
que o(a) companheiro(a) se assuste, se sinta preso(a) ou queira terminar a
relação.
Tal como acontece em relação a outros assuntos sérios,
é importante que estejamos em sintonia com a pessoa
que amamos em relação ao casamento. Se isso não
acontecer, é mais provável que haja um que se sinta
magoado, ressentido e desesperançado em relação ao
futuro a dois e que, mais cedo ou mais tarde, o assunto
se transforme numa fonte inesgotável de conflitos.
Tenho conhecido vários casais que
entraram, sem querer, num círculo vicioso em que um, com um perfil mais
ansioso, desespera por sinais claros de compromisso (e exerce muita pressão) e
o outro, que se sente pressionado, foge de qualquer compromisso sério. Como
estas conversas acontecem quase sempre ao fim de meses ou anos de relação, isto
é, quando ambos estão emocionalmente envolvidos, não é fácil terminar a
relação.
Quando é que se deve começar a conversar sobre casamento?
Antes de qualquer outra coisa, é
importante que você faça a sua autoauscultação. Como é que você se sente em
relação ao casamento? Não é em relação ao casamento com ESTA pessoa. Quão
importante é o casamento para si? É um sonho de vida? É um passo importante de
que não gostaria de abdicar? É indiferente? É algo que não quer para si? Faz questão
de se manter descomprometido(a)? Procure conhecer claramente os seus
pensamentos e sentimentos em relação a este assunto.
Depois, converse com o(a)
seu(sua) companheiro(a) sobre isso – sobre o que pensa e a forma como se sente
em relação ao casamento em geral – e procure conhecer a posição dele(a).
Esta conversa deve acontecer no início do relacionamento.
Os primeiros encontros devem ser leves e divertidos, mas é importante que nenhum dos membros do casal se envolva “demasiado” com alguém que, mais cedo ou mais tarde, possa mostrar que simplesmente não é a pessoa certa. Há poucas coisas que nos derrubem tanto como chegar a um ponto da relação em que percebamos que a pessoa que amamos não deseja o mesmo grau de compromisso que nós. Quando isso acontece, sentimo-nos desolados.
Um dos cenários comuns é este:
uma pessoa que deseja casar, ter filhos e assumir todos os compromissos “tradicionais”
conhece alguém, por quem se apaixona, e que revela, com clareza e honestidade,
que NÃO quer casar. A pessoa está tão apaixonada que:
1. Diz
a si mesma «Não faz mal. O importante é o amor que sentimos».
2. Diz
a si mesma «Não faz mal. Com o tempo, ele(a) vai acabar por ceder».
Quando aquilo que cada um diz que
quer é fruto da tal autoauscultação cuidada, o mais provável é que, a prazo,
este se transforme num problema sério. Mais cedo ou mais tarde, as necessidades
de ambos vão colidir e alguém – provavelmente os dois – vai sentir-se
injustiçado.
Numa segunda fase, que pode
variar muito de pessoa para pessoa, é importante que você se questione: «Como
é que me sinto em relação a casar COM ESTA PESSOA?» e, claro, que queira
saber como é que o(a) seu(sua) companheiro(a) se sente em relação a esse passo.
Mais importante do que determinar a data em que esta conversa deve acontecer, é
imprescindível que você olhe para o estado da sua relação:
Quão comprometidos estão com
as respetivas famílias de origem? Como é a sua relação com a família do(a)
seu(sua) companheiro(a)? Dão-se bem? Têm uma relação próxima? Há
desentendimentos sérios? Lembre-se de que quando nos casamos com uma pessoa,
assumimos a responsabilidade de criar laços com as pessoas que são importantes
para ela. Isso inclui fazer cedências, abdicar de tempo para estar com essas
pessoas e estar presente em momentos especiais.
Sentem-se emocionalmente ligados?
A conexão emocional determinará a qualidade e a durabilidade da sua relação.
Como é que você sabe se há conexão emocional? Preste atenção à vossa
comunicação. Conhece a bagagem emocional do(a) seu(sua) companheiro(a)? Conhece
as suas feridas emocionais? Os seus sonhos e ambições? Sabe o que mexe com
ele(a)? O que o(a) faz feliz? Como é que ele(a) reage aos seus desabafos?
Mostra-se feliz pelas suas conquistas e realizações? Preocupa-se quando você se
sente triste, preocupado(a) ou inseguro(a)? Há poucas coisas que nos unam
mais a uma pessoa do que a certeza de que ela se importa genuinamente com os
nossos sentimentos. Você sentir-se-á mais seguro(a) se viver com a profunda
convicção de que a pessoa que está ao seu lado é alguém que se importa e que
o(a) valoriza. Lembre-se de que é fundamental que se interrogue: «Quão
valorizado(a) se sente o(a) meu(minha) companheiro(a)?». Ele(a) sentir-se-á
mais entusiasmado(a) em relação à ideia de casar consigo na medida em que se
sinta considerado(a), valorizado(a).
Como está a confiança mútua?
Uma relação de compromisso é tão mais feliz, segura e duradoura na medida em
que haja confiança. Antes de falar sobre casamento, é importante que faça uma
auscultação à confiança mútua. Se tem dúvidas em relação à lealdade do(a) seu(sua)
companheiro(a), é melhor resolver essas questões antes de falarem em casamento.
Esta é também a altura de trazer para cima da mesa todos os assuntos sensíveis
do seu passado. Partilhar com a pessoa de quem gosta os seus erros ou os
assuntos mais difíceis, ajudá-lo(a)-á a sentir-se seguro(a). Pelo contrário, a
ocultação de acontecimentos importantes, como uma traição, uma dívida ou um
problema por resolver implicará que ele(a) se sinta atraiçoado(a) e que, mais
cedo ou mais tarde, a desconfiança se transforme em desconexão e ressentimento.
Como ter a conversa sobre casamento?
Arrisque. Não há volta a
dar. Se o casamento é um passo importante para si e se reconhece a vontade de
dar esse passo, mais cedo ou mais tarde você terá de se encher de coragem e
arriscar iniciar a conversa. Se ama a pessoa que está ao seu lado e a ideia do
casamento começa a fazer sentido para si, é melhor falar abertamente sobre os
seus sentimentos. Não brinque com o assunto, não minimize a sua importância.
Também não é preciso fazer ultimatos ou passar a ideia de que quer casar “amanhã”.
Mas seja claro(a) e honesto em relação à importância do assunto e aos prazos.
Se a ideia de casar daqui a cinco anos lhe parece longínqua e excessiva,
assuma-o com total transparência. A última coisa de que precisa é de trazer o
assunto de forma vaga e alimentar mágoa e ressentimento porque a pessoa que ama
não valorizou o seu apelo.
Explique que NÃO está a fazer um
pedido de casamento. Está a convidar o(a) seu(sua) companheiro(a) a conhecer os
seus sentimentos e a partilhar os dele(a).
Conversem sobre os vossos
valores. Nem todas as pessoas têm a consciência dos valores que norteiam a
sua vida, mas esses valores variam muito de pessoa para pessoa. Por exemplo,
algumas pessoas são ultra organizadas e responsáveis. Outras, privilegiam a
liberdade. Algumas dão muita importância aos laços com a família de origem
enquanto outras se sentem confortáveis com meia dúzia de reuniões familiares por
ano. Algumas pessoas cultivam a sua espiritualidade, enquanto outras nem sabem
o que isso é. Algumas são poupadas, outras são gastadoras. Algumas são
empreendedoras e gostam de arriscar, enquanto outras privilegiam a segurança e
a previsibilidade. Algumas sabem que só serão inteiramente felizes se tiverem
filhos, enquanto outras sabem que não quer ter. Algumas colocam a vida familiar
acima de todas as prioridades, outras valorizam sobretudo a progressão na
carreira.
Conversem sobre o que cada um
valoriza numa relação. Pode parecer estranho, mas algumas pessoas estão
juntas há anos e mal se conhecem. Pouco ou nada sabem sobre aquilo que o outro
valoriza na relação ou sobre aquilo que cada um pensa sobre o que é preciso
para fazer com que uma relação dê certo. Nem todas as pessoas se interessam
sobre Psicologia ou sobre a ciência dos relacionamentos, mas há inúmeros livros
e artigos disponíveis na Internet que os podem ajudar a conversar sobre estes “ingredientes”.
Estas conversas ajudá-los-ão a refletir sobre a capacidade de cada um para
assumir um compromisso tão sério (e tão gratificante) como o casamento).
Quanto mais claro(a) e honesto(a) conseguir ser em relação às suas necessidades e expectativas, mais fácil será para o(a) seu(sua) companheiro(a) avaliar se é capaz de se comprometer consigo. Por outro lado, é essencial que você queira GENUINAMENTE conhecer a pessoa que está ao seu lado e perceber se é capaz de fazer as cedências que permitam ter uma relação de compromisso em que ele(a) se sinta feliz. NÃO chega sonhar acordado(a) com um casamento feliz em que o(a) seu(sua) companheiro(a) é um mero personagem sem vontade própria. Tem a certeza de que ama o(a) seu(sua) companheiro(a) exatamente como ele(a) é e não apenas a imagem idealizada que construiu? Então, é altura de partilhar a sua vontade de avançar para este passo.